A este, faltam-lhe os bigodes. |
Tive a sorte de conhecer, já lá vão quase 50 anos, junto à fronteira leste de Angola, nas então denominadas “terras do fim do mundo” do Alto Zambeze, um velho Soba, de bigodes entrançados, que era um produto genuíno de velha África tradicional que provavelmente, naquele estilo, já vai ser difícil encontrar hoje.
Era casado com várias mulheres, algumas muito mais novas que ele, e a sua descendência vasta era constituída por muitos jovens ainda de pouca idade.
Um camarada meu, de forma maliciosa, perguntou-lhe se todos aqueles jovens eram filhos dele ao que respondeu, serenamente, sem ter acusado a malícia da pergunta, que todas as crianças que nasciam na sua cobata eram seus filhos.
De forma simples e sintética o que ele disse é que para a sociedade a que pertencia, o importante eram as ligações afectivas de carácter familiar e social porque se tratava de pessoas e não de bois-cavalos que pastavam ali ao lado, em imensas manadas nas planícies a perder de vista. Entre estes, só prevalecem as relações biológicas mãe-cria porque, fora dela, as crias morrem votadas ao abandono por todos os restantes elementos do grupo que não a reconhecem, num comportamento de aparente “crueldade” que as conduz inevitavelmente á morte sempre que as mães por variados acidentes, morrem numa lógica que será a da sobrevivência daquela espécie. As outras fêmeas não se podem “distrair” de outras crias que não seja a sua.
Nas sociedades primitivas
a família funda-se na criação de laços de aliança entre um homem e uma mulher,
de descendência que unem os pais aos filhos e de consanguinidade mas o aspecto
biológico é relegado para um segundo plano pois enquanto o vínculo biológico
mãe/filho é claro e directo o mesmo não acontece com a paternidade. Por isso, culturalmente,
o soba era o pai de todas aquelas crianças nascidas de mulheres suas e, daí a
resposta sábia:
- Se nasceu na palhota são meus filhos.
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