terça-feira, abril 16, 2013

O mamoeiro

O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 74


Mas nos dias de grande feriado nacional a cidade se movimentava. Ornamentava-se com bambus e bandeiras verde - amarelas.

A filarmónica tocava no palanque da praça da praça da Matriz, patrioticamente orgulhosa da sua perfeição. A melhor filarmónica das cidades e vilas das redondezas.

Na capital, poucas se lhe equiparavam. Assim mesmo, o Juca Carpinteiro que acumulava as funções de maestro, “não sabia, não”… Não punha a mão no fogo pela vitória de nenhuma banda da capital, se houvesse um desafio…

Quermesse. Turcos que tiram retratos instantâneos. Rapazes que conversam com as namoradas.

Grande feriado naquele dia. O benemérito prefeito (tão benemérito que a revolução não conseguira derrubá-lo. Mudara-lhe apenas o nome para interventor) organizara, juntamente com o Capitão Teodoro, um programa de festas de causar espanto.

Às três horas da tarde, falaria no palanque da Praça o Dr. Juiz e, à noite o Dr. Promotor faria uma conferência sobre a data.

O promotor era Ricardo Braz. Já criara fama de bom orador, com alguns discursos que fizera em dias tão solenes como aquele.

Nas festas recitava versos da sua lavra que faziam as delícias das moças solteiras e causava ciúmes a Ruth. Ricardo ia mesmo ressuscitar “O Cravo”.

Gostava do nome do jornal: “O Cravo”, podia atacar, furar, cravo de ferradura, e podia elogiar, dizer bem, flor.

Bom nome, sem dúvida. Pouco trabalho tinha Ricardo. Raros réus a acusar. Criava passarinhos. Conversava na farmácia. Amava a mulher. E sentia-se profundamente, inteiramente infeliz. Não nascera para aquela vida.

A “mesma coisa”, a “falta do inédito”, martirizavam-no. Os amigos tinham acertado: no casamento ele não encontrara a felicidade. Fracassara a sua experiência. O seu amor transformara-se no hábito.

O beijo da manhã, a conversa durante o dia, a briga por causa da comida, à noite juntos na cama. Ruth, sempre a mesma. Nunca lhe dera uma sensação nova, não lhe dizia coisas confortadoras.

Amava-a brasileiramente, muito burguesmente, como uma digna senhora casada, sem arroubos e sem vícios. A calma em que viviam torturava Ricardo Braz. Decididamente ele não nascera para aquilo. A estupidez daquela vida – comer, dormir, fazer um discurso uma vez ou outra, conversar com gente ignorante…

Fracassara… A insatisfação que pensara vencer, dominava-o completamente. E o desânimo vivia com ele. Passava dias silenciosos relendo os poucos livros que trouxera da Bahia. Ruth achava que ele “estava mudado”.

 - Você precisa, amorzinho de perder a mania da literatura…

 - Já sei…

Gostava de passar pelas roças vizinhas, a cismar. Enterrara a sua vida. Qualquer desses seria Juiz, não passaria disso, viraria um conspícuo juiz o resto da sua existência.

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