DO
CARNAVAL
Episódio Nº 63
- Você está louco, José…
- Por que, Paulo?
- É o seu intelectualismo, as suas aspirações,
tudo…
- Mas quem lhe disse que eu tenho aspirações?
Eu a nada aspiro. Não tenho veleidades literárias. Considero impossível
encontrar a Felicidade. E, demais, eu preciso pagar a pensão…
- Você…
- Ora, Paulo, eu já me desiludi de tudo. Estou
inteiramente convencido do que Pedro Ticiano diz. Os homens que estão fora do
comum, os homens diferentes não têm finalidade. Vivem por viver… é o que eu
faço.
- E a insatisfação? E a dúvida?
- Atitudes de espírito…
- Então você acha, como a mulher de Ricardo,
que tudo isso é literatura?
- Exactamente.
- Bonito!
- Ora, Paulo, o fim é a morte, como afirma
Ticiano. Só na morte reside a Felicidade, porque só a morte nos livra das dores
deste mundo.
- E você não se suicidou…
- Não se espante. Eu sou muito sentimental.
Porque dar a vocês, você, Ticiano, Ricardo, Jerónimo, que me estimam, esse
desgosto?
- Tem razão. Eu é que não me suicidei porque
não tive coragem.
- Só por isso?
- Principalmente por isso… É verdade que eu
pensei em minha mãe e em vocês… Mas a minha dor era grande… Fui um covarde…
- Tolices, Paulo. Deixe disso.
- Você sabe que ela vai casar?
- A sua ex-noiva?
- Sim, Maria de Lourdes.
- Não me causa grande surpresa. Afinal, a vida
é assim. Ela sentiu a necessidade de um marido. Arranjou-o, que tem isso
demais? Não foi você, foi outro.
- Eu é que sou um desgraçado. Deixei escapar a
Felicidade…
- Quem sabe se você não seria inteiramente
infeliz? O amor, Paulo, não traz a Felicidade… Nada na vida a traz…
- Nem a filosofia, José?
- Até dessa eu já descri.
Eu pensei que a filosofia nos desse pelo menos a serenidade, que resolvesse os
nossos problemas. Enganei-me. Uma desilusão a mais.
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