A
nossa moralidade não se fundamenta nos livros sagrados. A verdade é que existe
um consenso muito alargado do que está certo e está errado e que não tem uma
ligação óbvia com a religião.
A maior parte de nós não inflige
sofrimentos desnecessários, acredita na liberdade de expressão e protege-a
mesmo quando discorda do que é dito, paga os seus impostos, não engana, mão
mata, não comete incesto, não faz aos outros o que não gostaria que lhe fizessem.
Alguns destes bons princípios constam
dos livros sagrados mas sepultados ao lado de outros que nenhuma pessoa decente
desejaria seguir com a agravante de que os livros sagrados não facultam regras
com base nas quais possamos distinguir os bons dos maus princípios.
Uma forma de exprimir a nossa ética
consensual pode ser através de Dez Mandamentos, não só dos Dez Mandamentos do
Antigo Testamento, ou os do Novo Testamento, mas também de Novos Dez
Mandamentos, da actualidade, não esquecendo que, de acordo com “o espírito do
tempo”, eles reflectirão sempre o nível do avanço intelectual e cultural do
mundo na sua época.
Mas, para que melhor se possam
avaliar as diferenças entre os Novos Dez Mandamentos, que não são da autoria de
nenhum sábio, nem de um profeta ou de um eticista profissional, mas tão só de
um comum utilizador da web que mais não fez do que resumir, hoje, os princípios
consensuais da nossa vida, e compará-los com os Dez Mandamentos bíblicos, enunciaremos
estes em primeiro lugar e de seguida os Dez Mandamentos da Igreja Católica
antes de passarmos aos Novos Dez Mandamentos:
Antigo Testamento
1º Eu sou o Senhor teu Deus que te tirei da terra do Egipto, da
casa da servidão. Não terás outros deuses diante de mim.
2º Não farás para ti imagem de
escultura nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na
terra; nem nas águas debaixo da terra. Não te encurvarás a eles nem os
servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso que visito a maldade
dos pais nos filhos até à 3ª e 4ª geração daqueles que me aborrecem, e faço
misericórdia em milhares aos que me amam e guardam os meus mandamentos.
3º Não tomarás o nome do Senhor teu
Deus em vão; porque o Senhor não terá por inocente o que tomar o seu nome em
vão.
4º Lembra-te do dia de sábado, para o
santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. Mas o 7º dia é o
sábado do Senhor teu Deus; não farás nenhuma obra, nem tu, nem o teu filho, nem
a tua filha, nem o teu servo, nem o teu animal, nem o teu estrangeiro que está
dentro das tuas portas. Porque em seis dias fez o Senhor os céus, a terra e o
mar e tudo o que neles há, e ao 7º dia descansou; portanto abençoou o Senhor o
dia de sábado, e o santificou.
5º Honra o teu pai e a tua mãe, para
que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor teu Deus te dá.
6º Não matarás.
7º Não adulterarás.
8º Não furtarás.
9º Não dirás falsos testemunhos
contra o teu próximo.
10º Não cobiçarás a casa do teu
próximo, não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua
serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma do teu próximo.
Dez Mandamentos do Catolicismo (que muitos de nós aprendemos
ainda na infância, nas aulas da catequese):
1º Amar a Deus sobre todas as coisas.
2º Não invocar o nome de Deus em vão.
3º Guardar Domingos e Festas de
Guarda.
4º Honrar pai e mãe.
5º Não matar.
6º Não pecar contra a castidade.
7º Não roubar.
8º Não levantar falsos testemunhos.
9º Não desejar a mulher do próximo.
10º Não cobiçar as coisas alheias.
Cerca de 1500 anos separam estas duas
listas de Dez Mandamentos e percebe-se que o “espírito do tempo” que ambas
reflectem pouco ou nada difere, talvez menos do que na realidade dado o
carácter conservador dos textos religiosos.
Tanto numa como na outra a permanente
preocupação de manter os crentes obedientes e tementes ao Senhor que Ele, sim,
é a verdadeira razão justificativa dos próprios Mandamentos.
De forma paternalista, autoritária,
ameaçadora, o objectivo é manter o grupo unido, coeso, obediente e servil em
torno de um Chefe que é o Senhor mas que, na prática, são os dignitários da
Igreja, sendo que a crença, a tal necessidade genética de acreditar (nos nossos
pais, nos chefes, nas pessoas mais velhas) que nos primórdios da humanidade foi
factor de sobrevivência, constitui o íman que atrai as pessoas para as
religiões da mesma forma e pela mesma razão que leva a borboleta da traça ao
voou suicida contra a chama da vela.
Chegados a este ponto, Dawkins, através de um motor de busca da Internet
encontrou por acaso, numa página ateia, os seguintes Novos Dez Mandamentos em
paralelo com muitos outras listas que aí se podem encontrar.
Novos Dez Mandamentos (da autoria de
pessoas assumidamente não crentes):
1º Não faças aos outros aqui lo
que não qui seres que te façam a ti.
2º Em tudo, esforça-te por não
fazeres o mal.
3º Trata os teus semelhantes, os
seres vivos e o mundo em geral com amor, honestidade, lealdade e respeito.
4º Não ignores o mal nem te retraias
de aplicar a justiça mas está sempre pronto a perdoar a injustiça reconhecida
livremente e lamentada honestamente.
5º Vive a vida com alegria e
admiração.
6º Procura sempre aprender algo de
novo.
7º Testa todas as coisas; confronta
as tuas ideias com os factos e está pronto a pôr de parte mesmo uma crença
acalentada se ela não estiver em conformidade com eles.
8º Nunca procures censurar-te ou
abster-te das divergências; respeita sempre o direito dos outros a discordarem
de ti.
9º Forma opiniões independentes com
base na tua própria razão e experiência; não te permitas ser levado cegamente
pelos outros.
10º Interroga-te sobre tudo.
O filósofo John Rawls poderia incluir nesta lista algo deste
género:
- Imagina sempre as tuas regras como se não soubesses se vais
estar no topo ou na base da
hierarqui a.
O povo Inuit (vulgarmente, esquimós) segue uma regra para repartir a comida que também poderia fazer parte da
lista:
- Quem reparte fica
sempre com o último bocado.
Finalmente, Ritchard Dawkins, gostaria também de incluir numa lista destas e
da sua própria autoria, os seguintes Mandamentos:
- Desfruta da tua vida sexual (desde que não prejudique ninguém) e deixa que os outros desfrutem da sua em privado, quaisquer que sejam as suas tendências, que não são da tua conta.
- Não discrimines nem oprimas em função do sexo, da raça ou, na
medida do possível, da espécie.
- Não inculques ideias à força nos
teus filhos. Ensina-os a pensarem por si, a ajuizarem das provas e a
discordarem de ti.
- Valoriza o futuro em função de uma
escala de tempo maior do que aquele que tu tens.
Três mil e qui nhentos
anos após os velhos Mandamentos bíblicos surge-nos hoje, da autoria de pessoas
não religiosas, outros Mandamentos que revelam um mundo novo, diferente e,
quanto a mim, incomparavelmente melhor.
Que cada um de nós os julgue e os
faça seus, se qui ser, de acordo com
a sua própria razão, entendimento e sensibilidade.
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