segunda-feira, abril 08, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 67

O automóvel parou à porta de Jerónimo Soares. Bateu. De dentro só vinha o silêncio. Bateu novamente. Ninguém. Por fim deu socos na porta, enraivecido, louco por alcançar a casa onde o amigo agonizava.

Jerónimo apareceu a uma janela.

 - Quem bate?

 - Sou eu Paulo Rigger.

 Jerónimo veio abrir assustado.

 - Que há, Rigger?

 - Ticiano está morrendo. Vamos rápido.

Foi o tempo de Jerónimo enfiar as calças e um casaco. O auto arrancou de novo, rumando para a pensão onde residia José Lopes.

Depois de muito esmurrarem o portão enorme, apareceu a dona da casa, velhota gorda, mãos nos quadris:

 - O que é que querem?

 - Falar com o senhor José Lopes.

 - Não veio ainda. E não tem coragem de aparecer antes da madrugada. O tratante deve-me dois meses de casa. Chega tarde de noite e safa-se pela manhã. Não sei o que faz… tratante!

 - Basta, minha senhora. Quanto lhe deve o José Lopes?

 - Ora, quanto… Dois meses de casa a duzentos mil reis.

 - Eu pago.

E Rigger tirou o dinheiro da carteira. A mulher criou a amabilidade, no íntimo.

 - Desculpe-me, senhor. Mas o senhor compreende…

E contando o dinheiro, toda honestidade:

 - Mas há duzentos mil reis a mais.

 - É um mês adiantado. Mas não diga nada ao José. E, agora, onde poderei encontrá-lo?

 - Não sei, meu senhor. Ele nunca avisa onde vai…

Ficaram perplexos. Onde encontrar José Lopes?

 - Talvez já esteja em casa de Ticiano…

 - Não. O filho de Pedro disse-me que ele não chegara ainda e não sabia onde poder achá-lo.

E, de repente:

- Mas ele é sócio de uma casa de jogo. Você sabe onde, Jerónimo?

Jerónimo sabia. O automóvel rodou. Subiram longas escadas e num terceiro andar ouviram gritos de gente bêbada.

Deve ser ali.

O porteiro, interrogado, explicou-lhe que José Lopes há dias não aparecia. Uma vez ou outra, na vida, vinha ao clube. Só beber… E o porteiro filosofou, como bom mulato brasileiro:

 - Um tipo esquisito, aquele seu José Lopes. Sempre lendo e bebendo. Casos que começam assim eu já vi muitos…

Paulo e Jerónimo não ouviram, descendo as escadas.

O jeito é desistir. Vamos nós.

- Vamos.

O automóvel arrancou pelas ruas esburacadas, levando os dois homens, e o silêncio triste, pesado.

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