terça-feira, junho 18, 2013

SERÁ DEUS 

UM CONSOLO?
 (Parte II)


Como pode a religião comparar-se, por exemplo, à ciência, no que toca a estes dois tipos de consolo?

Olhando em primeiro lugar para o consolo do tipo um, é completamente plausível que os fortes braços de Deus, mesmo sendo puramente imaginários, consigam consolar tanto como os braços reais de um amigo, ou um São Bernardo com um barril de aguardente à volta do pescoço.

Considerando agora o consolo do tipo dois, é fácil acreditar que a religião possa ser extremamente eficaz. É frequente as vítimas de grandes desastres, como por exemplo, terramotos, afirmarem que lhes consola a ideia de que faz tudo parte do insondável plano de Deus: não duvidam de que, em devido tempo, algum bem há-de vir da tragédia.

Para quem teme a morte, acreditar que possui uma alma imortal pode ser consolador – a menos que esteja convencido de que vai para o inferno.

As falsas crenças podem ser tão consoladoras como as verdadeiras, até ao momento do desengano. O mesmo se aplica às crenças não religiosas. Um homem com cancro terminal pode ser consolado por um médico que lhe minta dizendo-lhe que está curado, com eficácia igual a outro homem a quem seja dito, com verdade, que está curado.

A crença sincera e profunda na vida depois da morte ainda é mais imune à desilusão do que a crença num médico mentiroso. A mentira do médico só é eficaz até os sintomas se tornarem inequívocos. Um crente na vida depois da morte nunca poderá, em última análise, ser desenganado.

As sondagens sugerem que aproximadamente 95% da população do E. U. da América acredita que vai sobreviver à própria morte. Mas eu pergunto-me, quantas pessoas religiosas e moderadas que dizem ter tal crença a acalentam verdadeiramente no mais profundo do seu íntimo?

Se fossem realmente sinceras comportar-se-iam todas como o abade de Ampleforth. Quando o cardeal Basil Hume lhe disse que estava a morrer, o abade mostrou-se felicíssimo por ele:

 - “Parabéns! Que bela notícia. Quem me dera ir com Vossa Eminência”. Parece, então, que o abade era um verdadeiro crente.

Por que motivo não dizem todos os cristãos e muçulmanos algo de parecido com o que disse o abade quando ouvem que um amigo está a morrer?

Quando um médico diz a uma mulher devota que não lhe restam senão alguns meses de vida, por que razão não sorri ela em emocionada antevisão como se tivesse acabado de ganhar umas férias nas Seychelles? «Nunca mais chega a hora!» Por que razão é que os amigos crentes reunidos à cabeceira para a visitar não a sobrecarregam de mensagens para os que já partiram? «Dá saudades ao tio Alberto quando o vires…»

Porque não falam assim as pessoas religiosas na presença dos que estão à beira da morte? Será que não acreditam de facto nas coisas todas em que presumem acreditar? Ou talvez acreditem, mas têm medo do processo de morrer. E com razão dado que a nossa espécie é a única que não tem permissão de ir ao veterinário para que, de forma indolor, lhe ponham fim ao sofrimento.

Richard Dawkins
(continua)

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