quarta-feira, agosto 07, 2013

JUBIABÁ

Episódio Nº 78


Cumprimenta António Balduíno:

 - Boa noite, seu Baldo.

 - Traz uma pinga.

O Gordo está atento à canção dos marinheiros:

 - É bonito…

 - E você entende?

 - Não, mas me bole cá dentro…

 - Lhe bole? -  Joaquim não entende.

Mas António Balduíno entende e já não sente vontade de brigar com os alemães. Agora ele gostaria era de cantar com os marinheiros e rir com as mulheres. Bate os dedos na mesa e assobia. Os marinheiros estão cada vez mais bêbados e um deles já não canta. Arriou a cabeça em cima da mesa.

O cego toca violão num canto da escuridão. Ninguém o ouve excepto o garoto pálido que serve o botequim. Entre as carreiras com copos de cachaça ele espia o cego com admiração. E sorri.

Mas de longe, do escuro do mar, vem uma voz que canta. Apesar das estrelas não se vê de quem é, nem de onde vem, se das canoas, dos saveiros, se do forte velho. Mas vem do mar esta toada triste. Uma voz forte, longe.

António Balduíno espia. Tudo negro em redor. Só há luz nas estrelas e no cachimbo do mestre Manuel. Os marinheiros já não cantam, as mulheres já não riem, o cego parou de chorar no violão para tristeza do garoto pálido que serve no botequim.

Jubiabá voltou para a mesa e seu António para o balcão. O vento que invade o botequim como uma carícia, traz a  tristura da voz. De onde virá ela? O mar é tão grande e tão misterioso que não se sabe de onde vem essa valsa triste.

Mas é um negro que está cantando. Porque só os negros cantam assim. Mestre Manuel está mudo. Será que ele pensa na carga de sapotis que seu saveiro vai pela madrugada receber em Itaparica? Não, ele ouve a toada da valsa. Ele se volta para o lado de onde parece vir a voz que enche o mistério do mar: de onde virá a voz do negro?

                          - «Senhor, dai tréguas aos meus ais…


Será que ele está no forte velho e é um velho soldado? Será que ele está numa canoa e é um camponês moço que vende laranjas na Feira de Água dos Meninos? Será de um canoeiro que está na sua canoa no Porto da Lenha? Virá de um rápido saveiro a sua voz, voz de um marinheiro negro que esqueceu a amada num porto distante?

                           - «Senhor dai tréguas aos meus ais…
                                Mata-me esta dor
                                De eu não vê-la mais…


De onde virá a toada triste que atravessa os saveiros, as canoas, o quebra-mar, o cais, a “Lanterna dos Afogados, a baía toda e que vai se perder nas ladeiras da cidade?


O Gordo bem vê que António Balduíno ouve nervoso. Ele pensa em Lindinalva e julga que o preto canta unicamente para ele, que está tão só.

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