Episódio Nº 86
- «Você está na lanterna do saveiro…
Passam junto da lanterna
do «Paquete Voador». Guma sacode um embrulho de dinheiro dentro do “Viajante
sem Porto”.
Quinze mil réis, Mestre
Manuel mete os cinco no bolso da calça e grita:
- Boa viagem, Guma. Boa viagem…
- Boa viagem, a voz vem lá de trás
António Balduíno pega os
dez mil réis que ganhou:
- Compre um vestido para ela, Manuel. Foi ela
que ganhou…
-
«A estrada do mar é larga, Maria…
António Balduíno pensa
onde andará o homem branco e calvo que naquele apareceu na macumba de Jubiabá.
Onde ele estará, onde estará o homem que António Balduíno julga ser Pedro
Malazarte, o aventureiro?
É preciso que ele não
esqueça essa viagem de saveiro, quando escrever o A B C do negro António
Balduíno, valente e brigão, que ama a liberdade e o mar.
Mestre Manuel entregou o
leme a António Balduíno agora que o rio é largo. Foi com a mulher para o fundo
do saveiro. Estão escondidos atrás da camarinha. Mas se ouvem os ruídos dos
corpos no amor. Vêm gemidos em voz baixa, súplicas e beijos.
Vem uma onda alta que
cobre os amantes. Eles riem entre beijos. Nesse momento estarão molhados e o
amor ainda será melhor.
António Balduíno imagina
jogar o saveiro sobre as pedras do rio. Morreriam todos e os gritos e beijos se
extinguiriam no mar.
O Gordo, que perdeu nessa
noite uma estrela e um anjo fala.
- Ele não devia ter feito isso…
CHEIRO DOCE DE FUMO
Cheiro doce de fumo!
Cheiro doce de fumo! Invade as largas narinas do Gordo que entontece. O saveiro
ficou no porto unicamente os dias das feiras das cidades vizinhas: Cachoeira e
São Félix.
Depois partiu para outros
portos pequenos, Maragogipe, Santo Amaro, Nazaré das Farinhas, Itaparica,
levando seu Manuel e a mulher que cantava durante a noite e cheirava a mar.
Abriu as velas e partiu na manhã saudosa. Valia como uma despedida.
António Balduíno e o Gordo
ficaram na cidade velha de Cachoeira, medindo o comprimento das ruas numa
vagabundagem forçada.
Sentiam a cidade pelo cheiro.
Era aquele cheiro adocicado de fumo que vinha de São Félix defronte, das
fábricas brancas que tomavam quarteirões inteiros e que eram gordas como os
seus donos.
Cheiro que tonteava, que
fazia pensar em coisas distantes, que obrigava o Gordo a contar longas
histórias inventadas ou repetidas.
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