Baldo - António Balduíno |
JUBIABÁ
Episódio Nº 130
E foi assim, dizendo este tipo de coisas
que o palhaço fez toda aquela gente feliz na noite da estreia do circo. Os
empregados no comércio riam, o juiz ria, os negros da geral gargalhavam.
Só o homem viajado achava aqui lo tudo uma porcaria e os dez tostões jogados
fora. Mas ele tinha perdido a pureza. Há anos, nas grandes cidades onde fora
estudante, antes do pai morrer e ele ter que pegar no metro na casa de seu
Abdula.
O macaco dançou. O urso bebeu uma
garrafa de cerveja. O homem cobra era assexuado e se torcia todo. Dava nervoso.
Botava a cabeça nos pés, virava o corpo para o lado, metia os pés na boca,
ficava deitado em cima de uma caixa pequena só com o ventre que era de mulher,
as pernas nas costas, a cabeça também.
Trabalhava bem mas irritava os homens
porque não tinha sexo definido e eles ficavam angustiados sem saber se o haviam
de amar, pensar nele como em uma mulher, ou se deviam aplaudi-lo como se
aplaude um homem macho.
Só nos olhos do homem viajado brilhava
uma luz estranha e criminosa. O homem cobra agradeceu com o seu rosto de anjo,
jogou beijos como Robert, o grande equi librista,
curvou-se como Fifi, a trapezista célebre.
As mulheres recolheram os beijos, os
homens os cumprimentos. Só o homem viajado deixou o seu lugar porque o
espectáculo estava acabado para ele. Levou a sua miséria no coração e nos olhos
e não dormiu.
O grande equi librista
Robert não estreia esta noite. As mulheres se entristeceram. Em compensação ali
está Rosenda Rosedá., a incomparável.
A INCOMPARÁVEL, ROSENDA ROSEDÁ
Se nos apresenta orgulhosa
ATINGINDO O ÁUREO PORTO DA SUA CARREIRA
NO
TABLADO
A tormenta emocional é um
maxixe emocionante. Será que por debaixo da saia da baiana ela não tem roupa
nenhuma?
Parece que não porque
mostra as coxas até ao meio e não se vê pano algum. Em cima dos peitos traz
colares de contas multicores.
Faz grandes XX com as
pernas. A mulher do juiz acha que decididamente é uma imoralidade e que a
polícia não devia permitir.
O juiz não concorda, cita
a constituição e o código, diz que a mulher não é civilizada e não quer
conversa, quer é espiar as coxas de Rosenda Rosedá, a incomparável.
Mas agora todos têm coisa
melhor para olhar. Ela rebola as ancas. Desapareceu toda, só tem ancas. As suas
nádegas enchem o circo, do teto até à arena. Rosenda Rosedá dança.
Dança mística de macumba,
sensual como dança religiosa, feroz como dança da floresta virgem. Ela está
mostrando o corpo todo mas o seu corpo é um segredo para os homens, porque, mal
aparece, a saia o cobre, o esconde.
Eles estão irritados e
fixam a vista, mas é inútil. A dança é rápida demais, é religiosa demais e eles
são dominados pela dança.
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