Episódio Nº 137
Por que, então, pensa que a mulher de
cabelos lisos é virgem? Ela está num canto sem ver nada, sem olhar para
ninguém, distante do cabaré, dos frequentadores, do copo de bebida que está na
sua frente.
Se o Gordo estivesse ali, António
Balduíno pediria que ele inventasse uma história de menina abandonada, sem anjo
da guarda sem ninguém no mundo. E se fosse Jubiabá que estivesse ali ele
pediria ao pai de santo para fazer feitiço contra o homem que está explorando a
virgem, que a obriga a vir para o cabaré e a beber aquelas bebidas.
António Balduíno olha para Robert que
pisca para a velha. Bem que pode não ser virgem… Mas quem é que não conhece
logo que ela é virgem e que um homem a explora?
Ela está no cabaré, bem na mesa do canto,
mas os seus olhos não estão olhando para nada, estão perdidos para além da
janela. Ela pensará nos irmãos sozinhos, pequenos, na mãe doente. O pai já
morreu. Será por isso que ela está aqui .
Ela veio vender a sua virgindade esta
noite para comprar remédios. Pois a mãe não está doente, quase à morte e sem
médico, sem um único vidro de remédio?
António Balduíno pensa ir até ela e tem
vontade de oferecer dinheiro. Em verdade está sem um níquel, mas furtará de
Luigi.
Um empregado do comércio a tirou para
dançar. É um tango. Ela vai vender a virgindade a quem der mais dinheiro.
Porém, que entende ela de dinheiro?
É capaz de nem receber nada e a mãe
morrer. Tudo é inútil. Sua mãe não se salvará, os irmãozinhos morrerão também
de maleita, pois as barrigas são enormes e os rostos pálidos.
Um homem virá – por que não Robert, o equi librista? – e a explorará, venderá o seu corpo
virgem e moço na Feira. Venderá aos camponeses, aos choferes, a todos os
homens.
E ela se apaixonará pelo flautista,
Robert lhe dará surras, ela morrerá um dia de tuberculose como a mãe. E não
terá filha que se prostitua para arranjar dinheiro para comprar remédio.
Mas não é ela que vai sair com o
empregado do comércio? Não, o negro António Balduíno, não consentirá. Ele irá
roubar o dinheiro de Luigi, dinheiro que é para a comida do leão, mas não
deixará que ela perca a virgindade. Se atira para a frente e encosta a mão no
ombro do rapaz:
-
Solte ela.
-
Vá se meter em sua vida…
A mulher tem os olhos distantes.
-
Ela é donzela você não sabe? Ela tá vendo se salva a mãe que vai morrer. Mas
não adianta…
O rapaz empurra o negro com a mão…
António Balduíno de tão bêbedo que está, cai para cima de uma mesa. Chora como
uma criança. O rapaz sai com a mulher que lá fora diz:
-
A cachaça daquele deu-lhe para me achar donzela…
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