quarta-feira, outubro 16, 2013

JUBIABÁ

Episódio Nº 138

Mas por que é que o rapaz está rindo? Ela também quer rir, quer rir muito da cachaça do negro, mas não pode, tem um nó na garganta. Uma angústia repentina a toma toda a ela, sem explicações, abandona o homem que ainda ri sem compreender, e vai sozinha para o seu quarto, onde dorme um sonho de virgem do qual não acordará mais porque tomou cianureto.

No cabaré, António Balduíno, cada vez mais bêbedo canta entre aplausos e toma a velha de Robert, o equilibrista. Sai um princípio de barulho com o dono do cabaré porque eles não têm com que pagar as bebidas.

Ao voltar para o Circo entra na barraca de Rosenda Rosedá, que foi para isso mesmo que ele bebeu tanto.


Luigi vive de lápis em punho fazendo contas. E se ele berra tanto na sua jaula não é de ferocidade que ele é tão manso como o cavalo Furacão.

Ele berra assim é de fome, porque nem dinheiro para a sua comida o circo tem.

Não adianta Luigi fazer tantas contas. Há dois dias que Giusepe não bebe, porque nem para uma pinga ele arranja dinheiro e ninguém lhe fia mais. E para Giusepe a vida é triste sem cachaça.

A cachaça o transporta ao passado, trás para junto de si aquelas a quem ele amou e que já morreram. Sem bebida ele tem que tomar conhecimento das dificuldades do circo, da falta de dinheiro que torna os artistas brutos e preguiçosos.

Nunca mais o circo pegou uma enchente como a da noite da estreia. Esses 15 dias em Feira de Sant’Ana têm sido maus. Em dois espectáculos o circo deu todos os números e em dois espectáculos toda a população veio ao circo.

Só na outra segunda-feira ainda houve gente: alguns camponeses que ficaram na feira. Assim mesmo poucos porque não havia luta e eles gostavam era de luta.

Não tinha aparecido mais nenhum adversário para António Balduíno. Não valera a pena a Empresa aumentar para dez contos o prémio para o vencedor, e Baldo, o boxer, apostar dois contos na sua vitória.

A fama do negro correra pela redondeza e ninguém queria passar pela vergonha de apanhar. Agora António Balduíno suspendia marombas nos espectáculos pouco frequentados do circo, lutava com o urso que se deixava vencer com a maior facilidade, e terminou acompanhando Rosenda Rosedá ao violão. Para ele pouco importava que existisse ou não dinheiro.

Havia Rosenda. Não pensava noutra coisa. As noites passadas com Rosenda pagavam bem a maçada de suportar os porres de Giusepe, o silêncio de Robert, as queixas de Bolão que vivia se lastimando da vida.

“Que abandonara o curso no segundo ano, tinha tirado até boas notas no exame, a não ser em Direito Civil que passara com simplesmente 4 por perseguição do professor, que não gostava dele desde a vaia na aula.

O pai de Bolão parecia rico, toda a gente dizia que ele estava cheio do burro do dinheiro. O velho gastava como homem de posses: morava numa casa de aluguer caro, piano para a filha, professores de francês e inglês, projectos de viagem à Europa.

Era cardíaco e disso ninguém falava, nem ele sabia. Morreu de repente quando atravessava a rua. Foram ver, só tinha deixado dívidas. Fora assim que Bolão terminara, usando o apelido que lhe tinham posto no colégio, no picadeiro de um circo, vestido de azul com estrelas amarelas e uma lua vermelha nos fundilhos”.

Repetia aquela história diariamente para terminar dizendo sempre:


 - Podia ter me formado… Me metia na política que sempre dei prá coisa e hoje era capaz de estar deputado. 

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