quinta-feira, novembro 21, 2013

Doente? - Morrendo.
JUBIABÁ

Episódio Nº 168



Ela não o reconhece, nem o vê sequer. Fuma o cigarro e pergunta com voz doce, voz que recorda aquela outra Lindinalva que corria no Parque da Nazaré e brincava com o negrinho Baldo:

 - E a cerveja? Vocês vão me dar, não vão?

António Balduíno consegue tirar os dez mil reis do bolso. Entrega à mulher que ri e soluça. E tremendo de medo, tremendo de pavor, sai a correr Ladeira acima e só tem descanso na casa de Jubiabá, chorando junto do pai santo que o acaricia como no dia em que Luísa enlouqueceu.

Quando o vapor passou (e durou dias) ele voltou à casa de Lindinalva. No quarto onde a cama de casal tomava o maior espaço, Lindinalva se acaba.

Amélia contem as lágrimas. Ele entra devagar, como lhe recomendou a prostituta que soluça na porta. Amélia não se admira de o ver. Bota o dedo na boca em sinal de silêncio. E vem para junto dele, que pergunta:

 - Doente? – aponta Lindinalva com o dedo.

 - Morrendo.

Com a morte que se aproxima ela tornou a ser a mesma Lindinalva da Travessa Zumbi dos Palmares. Seu rosto está sereno e belo. Seu rosto sardento, rosto de santa.

As mãos que tocavam piano e machucavam rosas são as mesmas. Nada resta da Lindinalva da Pensão Monte Carlo, da Linda da Rua de Baixo, da Sardenta da Ladeira do Taboão.

Ela agora é novamente a filha do Comendador que morava na casa mais bonita da Travessa do Zumbi dos Palmares e esperava um noivo na Nau Catarineta.

Mas ela se move e aparece outra Lindinalva. Esta, António Balduíno não conheceu. Mas Amélia sabe qual é. É a noiva de Gustavo, é a amante de Gustavo, é a mãe de Gustavinho.

Um rosto risonho de senhora jovem. Ela murmura qualquer coisa. Amélia se aproxima e pega na mão. Ela está dizendo que quer o filho, que o tragam que ela vai morrer.

Amélia volta chorando. António Balduíno pergunta.

 - E o doutor?

- Não pôde fazer mais nada… Disse que agora é esperar a morte.

Mas António Balduíno não se conforma. Tem uma inspiração.

 - Vou buscar pai Jubiabá…

 - Passe em minha casa e traga a criança…

E ele que veio ali para se vingar, para a possuir e depois jogar dois mil reis no seu leito… Veio para insultá-la, para dizer que branca não vale nada, que um negro como ele faz o que quer.

Agora vai buscar pai Jubiabá para ver se a salva. Se ela ficar boa ele desaparecerá. Mas se ela morrer que poderá ela fazer na vida? Não lhe restará outro caminho senão o caminho do mar por onde entrou Viriato, o Anão, que também não tinha ninguém no mundo.

Só então António Balduíno compreende que se Lindinalva morrer ele ficará só, sem nenhum outro motivo para viver.

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