Cristiano Ronaldo em 2003
– Estádio José Alvalade
Sporting - 0 Manchester - 1
«Depois de muitos
anos como adepto de sofá tive ontem a oportunidade de ver, olhos no relvado, o
meu Sporting.
É certo, que no meu regresso aos
estádios nem tudo foi agradável por causa daquela cena caricata em que fui
apalpado e revistado e quase impedido de entrar por causa de uns simples
binóculos que eu julgava serem inofensivos e inocentes.
Explicaram-me que era uma questão de
segurança pois, de há uns anos a esta parte, pessoas perigosas têm vindo a
insinuar-se junto dos pacíficos sócios e adeptos dos clubes de futebol para, a
coberto de grandes ajuntamentos, darem vazão às suas frustrações e maus
feitios.
Mas os receios eram infundados e foi
num ambiente de saudável confraternização que me reencontrei com o pessoal da
minha tribo naquele cenário electrizante, cheio de reflexos verdes e brancos a
tremelicarem provocados por painéis agitados por milhares de braços num
espectáculo de cor e brilho.
-Spór-Ting e do outro topo
respondiam, Spór-Ting e mais uma vez e outra e ainda outra, numa comunhão de
sons em uníssono que desafiavam os melhores coros da Gulbenkian.
O colega sentado ao meu lado acendeu
nervosamente um cigarro e pediu-me desculpa pelo fumo que sobrava para mim:
-“Não consigo evitar… sabe, vim de
Coimbra ver o nosso Sporting”.
- “Não tem importância, amigo…deixei
de fumar há 12 anos e se hoje voltar a fumar um bocadinho do seu não faz mal”
Entretanto, à nossa volta,
acendiam-se mais cigarros e o isqueiro do meu vizinho andava numa roda-viva, de
mão em mão, com a naturalidade do usufruto de um bem pertencente à comunidade
da tribo.
Um jovem casal de namorados, duas
filas a seguir à minha, alheados do mundo, trocavam carinhos com a mesma
naturalidade e à-vontade com que, mais abaixo, no relvado, os jogadores faziam
exercícios de aquecimento.
Aguardava-se o início do jogo e os
rostos espelhavam uma serenidade contida.
O adversário era uma das melhores equi pas do mundo, das mais ricas e poderosas e mesmo
que perdêssemos, a honra da “tribo” não sairia muito abalada.
Afinal, não nos podemos esquecer, que
enquanto nós vamos buscar jogadores a custo zero eles nem sequer discutem os
milhões com que adqui rem os seus.
O jogo começou e o Manchester, em
estilo de treino, como de quem não está para se maçar muito, ofereceu-nos o seu
meio campo e “disse-nos: vejam lá se nos conseguem marcar um golo” e nós lá
fomos: atacámos… atacámos…atacámos até que sofremos o golo que ditou o
resultado final.
Sirva-nos de consolação de que
perdemos com um auto-golo, claríssimo e assumido.
O Cristiano Ronaldo, às vezes, faz
daquelas coisas… mas como, logo de seguida, pediu perdão de mãos postas e, além
disso, encheu o campo com as suas avançadas mágicas, todos nós, sportinguistas,
não só lhe perdoámos como ainda nos despedimos aplaudindo-o de pé.
Nesse momento senti-me orgulhoso da
minha tribo. Cá para mim, ganhámos o jogo e Viv´ó Sporting!»
Nota - Futebol é isto: Emoções,
afectos, alegria, tristeza… e raiva quando nos anulam um golo limpo que daria ontem ao Sporting uma vitória em casa com o Nacional do Marítimo.
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