quinta-feira, janeiro 30, 2014

Ainda as Praxes

Académicas



As praxes que estiveram na origem da morte estúpida de seis jovens continuam, como não podia deixar de ser, notícia puxada pela TVI que iniciou a averiguação.

Sabemos, por ela, que se tratou de uma realidade muito mais complexa do que o simples e inofensivo mas ridículo desfile de caloiros.

A Democracia e a liberdade trouxeram, e ainda bem, a disseminação de Estabelecimentos de Ensino Superior, públicos e privados, um pouco por todas as cidades do país que num desejo de se assimilarem às velhas e tradicionais Universidades de Lisboa e Coimbra, da Capa e Batina, logo desencadearam as praxes académicas e, como tudo o que nasce por imitação, tentaram ultrapassar o imitado por excessos e exageros do tipo "mais papistas que o Papa".

Aquilo que vimos e nos foi mostrado aproxima-se das cerimónias de iniciação  características de sociedades primitivas em que os jovens, enquadrados pelos mais velhos, são submetidos a uma série de práticas que os testam na coragem e capacidade de sofrimento para poderem passar para um novo estatuto social de homens e mulheres reconhecidos socialmente.

A vida de uma sociedade primitiva em contacto directo com a natureza envolve riscos, pressupõe conhecimentos ensinados pelos mais velhos desde o nascimento e requer coragem, serenidade e uma atitude de humildade perante o perigo.

As  praxes que vinham a ocorrer na praia do Meco, se eram uma forma de iniciação, estavam erradas, eram inúteis e não representavam nenhuma atitude de humildade perante a vida e muito menos perante a natureza porque o mar não se enfrenta de noite, de costas viradas e de mãos atadas...

Se as Associações Académicas pretendem fazer uma cerimónia para integrarem os caloiros através dos alunos veteranos, promovam um "almoço de recepção aos caloiros", façam discursos, ponham-nos falar e eles não esquecerão mais esse dia.

Os actos de violência física ou de humilhação são aquilo que são independentemente da sua graduação. Podem terminar com a morte, como foi o caso do Diogo Macedo em Famalicão ou estes agora na praia do Meco, como podem também traduzirem-se em sequelas psicológicas ou simples recordações desagradáveis da vida estudantil.

Desenvolveu-se no espírito dos estudantes que submeterem-se à praxe os promove socialmente no seio dos colegas para um outro patamar que implica mais respeito... e afinal não passa de uma "curiosidade" bizarra da vida estudantil em Portugal que não existe em qualquer outro país da Europa.

Vê-los autorizados e  sancionados pelas autoridades académicas e pelos governos representa uma cobardia perante uma "força" que tem expressão eleitoral e convém não hostilizar. Por isso, na Assembleia da República, o único partido que pretende ilegalizar as praxes é o Bloco de Esquerda...

E não vale a pena disfarçar com "regras anti-violência" como forma de perpetuar as praxes porque elas, pela sua própria natureza, vivem da violência e da humilhação... maior ou menor.

Para aquele grupo de alunos agora envolvidos no trágico acidente, mortos ou sobreviventes, deu para perceber que o ensino, os estudos e as aulas estavam em segundo plano. 

Importante... importante...eram as praxes, até morrer por elas.

Pobres pais... pobre família... é neles que eu penso. Digerirem este desaparecimento dos filhos e netos vai ser um processo doloroso que os vai marcar enquanto vivos na parte dos seus seres que não foi também arrastada pelas ondas.

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