Quanto ao Comandante. morreu nesse subúrbio de Periperi, em 1952 |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 67
Onde o narrador, atrapalhado
e oportunista, recorre ao destino
Vejam os senhores: mete-se um esforçado
historiador a pesqui sar a verdade em
anais tão embrulhados quanto estes, e, de repente, depara com versões
desencontradas e opostas, na aparência merecedoras de crédito umas e outras.
Em quem acreditar?
Das duas versões expostas, a do próprio
comandante, homem de méritos indiscutíveis, e a de Chico Pacheco, com tantos
detalhes comprováveis, qual preferir e oferecer à boa fé dos leitores?
Está esse moço atravancado de
obstáculos, rodas de leme e devassas de mulheres da vida, não sei como
chegar-lhe ao fundo para de lá arrancar, resplandecente e nua, a verdade capaz
de exaltar a memória de um dos dois adversários e expor a do outro a execração
pública.
Exaltar a quem, qual desmascarar? Para
ser sincero, devo confessar encontrar-me, nessa altura dos acontecimentos,
desorientado e confuso.
Aconselhei-me com o Dr. Alberto
Siqueira, nosso eminente porém discutido luminar da ciência jurídica. Juiz
durante tantos anos, no inferior e na capital, devia estar ele apto a enxergar
a luz da verdade nessa trapalhada toda.
Tirou o corpo fora, o Meritíssimo,
afirmando ser-lhe impossível uma sentença ou mesmo um parecer sem aprofundada
análise dos autos do processo. Como se estivesse julgando a pendência entre
Chico Pacheco e o Estado, e não um trabalho de pesqui sa
histórica com vistas a um prémio do Arqui vo
Público.
Feriu-me o tratamento dado às minhas páginas e
lhe disse. Mas o fátuo magistrado replicou-me secamente faltar ao meu estudo as
mais rudimentares noções do que seja obra de historiador.
A começar pelas datas. Insuficiência de
datas, ninguém consegue saber direito quando se passam os sucessos narrados, o
tempo decorrido entre eles, dia, mês e ano de nascimento e morte das principais
figuras.
Onde já se viu livro de História sem
datas? O que é a História, senão uma sucessão de datas a recordar feitos e factos?
Engoli calado a crítica, não me havia
preocupado com esse detalhe. E aproveito para esclarecer o assunto aqui mesmo, dando em seguida as datas mais
necessárias.
De nascimento e morte, não sei de quase
ninguém, nem do velho Moscoso, nem mesmo do Governador. Quanto ao comandante,
morreu nesse subúrbio de Periperi, no ano de 1950, aos 82 anos de idade, e, fazendo-se
as contas, logo se descobre ter nascido em 1868, andando pelos trinta e tantos
anos quando se tornou amigo íntimo daquelas influentes personalidades.
Já se sabe haverem decorrido os factos
narrados por Chico Pacheco, verídicos ou inventados, no começo do século,
durante o governo José Marcelino, iniciado em 1904, e datar de 1929 a mudança do comandante
para Periperi.
Que outras datas devo precisar? Não sei,
para falar francamente. Aliás, nunca consegui decorar datas nos manuais de
História, nem nomes de rios e vulcões nos de Geografia.
Ao demais, a seca restrição do
Meritíssimo obedece menos a um justo critério crítico do que a certa má vontade
em relação a mim, demonstrada ultimamente pelo juiz.
Começou há alguns dias, deixou de
tratar-me com a mesma antiga estima, não mais me convidou a acompanhá-lo à casa
de Dondoca pelas tardes, e, por mais que o adule, elogiando-lhe os conceitos e
a virtude, mantém-se reservado, a olhar-me acusadoramente.
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