quinta-feira, maio 08, 2014

Fugiu... anunciou Chico Pacheco - Nunca mais vai voltar.
OS VELHOS
MARINHEIROS

(Jorge Amado)

Episódio Nº 74










Vai, não vai, é um farsante, é um grande homem, a discussão cresceu, a notícia se espalhara, arrancando das casas os aposentados e retirados dos negócios e trazendo-os à estação, apesar da chuva sem tréguas, cada vez mais forte.

 Discussão e chuva continuaram mesmo depois da partida do comandante, acompanhado de Balbina, pelo trem das duas da tarde, vestido com sua farda de gala.

Caco Podre carregava-lhe as malas, na mão o comandante levava a magnífica luneta. Na estação, apertou, num adeus, as mãos de amigos e adversários, indistintamente; apertaria a de Chico Pacheco talvez, se o ex-fiscal do consumo não se houvesse afastado para um extremo da plataforma.

Quando a composição chegou, o Comandante Vasco Moscoso de Aragão abraçou Zequinha Curvelo, prendendo-o longamente contra o peito. Não disse uma palavra. Da porta do vagão, bateu a mão no boné em continência.

- Fugiu ... - anunciou Chico Pacheco. - Nunca mais vai voltar.

- Vai comandar o navio até Belém - afirmou Zequinha Curvelo.

- É preciso ser muito burro para acreditar nisso. Se não arranjarem outro comandante, esse navio cria raízes no porto. O charlatão vai é sumir no mundo, ninguém vai saber mais dele.

- Calúnias.

- E por que então ele levou a empregada? Um dia desses, vocês vão ver, aparece alguém para recolher-lhe os trastes, trazendo a notícia de que a casa foi vendida. Ele já estava preparando a fuga, apenas se apressou.

- A verdade se saberá. Quem viver, verá - disse Zequinha, que amava as grandes frases.

Às cinco horas da tarde, vários deles encontravam-se na praia, apesar da chuva. Dali viam o cais da Bahia, distinguiam no dia enevoado o vulto negro e majestoso do Ita nas manobras de desatracação.

Saía fumaça do bueiro, estaria apitando naquele momento. Rumava depois em direcção à barra, desaparecia alem do quebra-mar.

E as discussões prosseguiram, ásperas e violentas, até que os jornais trouxeram as primeiras notícias, chegadas por telegrama.

                            
TERCEIRO EPISÓDIO



MINUCIOSA DESCRIÇÃO DA IMORTAL VIAGEM DO COMANDANTE A COMANDAR UM ITA, DOS MÚLTIPLOS SUCESSOS DE BORDO, ROMÂNTICOS AMORES, DISCUSSÕES POLÍTICAS, VISITA GRATUITA AS CIDADES NAS ESCALAS, COM A CÉLEBRE TEORIA DAS BAQUEANAS E OS VENTOS EM FÚRIA DESATADOS



Do Comandante na Ponte de Comando


Subiu a escada de bordo acompanhado por Américo Antunes, o representante da Companhia.

 Um marinheiro levava-lhe as duas maletas. Forte comoção tomou-lhe o peito quando pôs os pés no navio, mal escutava a voz do outro a apresentá-lo a um homem bem trajado:

- O Dr. Homero Cavalcanti, senador pelo Rio Grande do Norte, o Comandante Vasco Moscoso de Aragão...

- Uma sorte, Comandante, encontrar-se o senhor na Bahia. Senão estaríamos retidos aqui, para mim seria um horror. Tenho assuntos importantes em Natal a esperar-me...

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