Mas, Comandante, o que é isso? |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 93
- Dança bem, Comandante. Eu é que
agradeço. Foi para junto de Clotilde, ao piano. Ela comentou:
- Pra isso é que me pediu para tocar,
não foi?
Não houve mais passeio naquela noite.
Quando, finalmente, os jovens deixaram-na levantar-se e partir, já era quase
meia-noite e Clotilde preocupava-se com o pequi nês,
sozinho na cabine.
Combinaram visitar juntos Recife, no dia
seguinte. Ela ainda estava um pouco arrufada e tachou a mameluca de
“desavergonhada”.
Vasco foi à sala de jogo. Rapazes jogavam
king, três mesas de poker estavam funcionando. Numa delas, brilhava o tal
capitalista em viagem de prazer, numa cadeira a peça de biscuit. Os outros
parceiros eram comerciantes e fazendeiros. Perdiam os três. Vasco puxou uma
cadeira, sentou-se ao lado do afortunado jogador:
- Dão-me licença?
- Ora, Comandante, por favor ... -
respondeu um dos fazendeiros.
- Conhece o jogo, Comandante? -
perguntou o rapaz de sorte.
- Não sei jogar, não entendo. Mas gosto
de ver... Quem está ganhando?
- Não está vendo? - falou outro
perdedor. - O Dr. Stênio. Nunca vi tanta sorte. Está de ganhador aberto.
O citado Dr. Stênio riu satisfeito, da
pilhéria talvez, talvez da notícia sobre a ignorância do comandante em matéria
de poker. Demorou-se Vasco, ali sentado, fazendo, de quando em vez, uma pergunta
idiota a propósito do valor dos jogos e das apostas. Acompanhava Stênio a dar
cartas, interessado.
- O senhor desembarca em que porto, Dr.
Stênio?
- Em Belém. Ficarei
alguns dias por lá, talvez siga até Manaus num vaticano. Devo voltar no
Almirante Jaceguay, do Lloyd. - E replicava a aposta de um fazendeiro: - Seus
32 mais 64.
Por volta de uma hora e meia da
madrugada, um dos parceiros, cujas perdas subiam a vários contos de réis,
propôs a roda-de-fogo. Vasco assistiu à prestação de contas, às despedidas.
Um dos fazendeiros ficaria em Recife,
lamentou não continuar a viagem para recuperar o prejuízo. O Dr. Stênio
embolsava os lucros, ia pegar a peça de biscuit, preparava-se para recolher-se
à cabine.
O comandante, no entanto, deixando
partir os outros parceiros, disse-lhe:
- Ainda é cedo, vamos conversar um
pouco, Doutor .. .
- Estou morrendo de sono, Comandante.
Fica para amanhã.
- Hoje mesmo e agora. Ouça, seu
batoteiro vagabundo, você não vai a Belém, interrompe sua viagem em Recife...
- Mas, Comandante, o que é isso?
- É o que eu lhe digo. Nasci jogando
poker, meu caro. Andei quarenta anos embarcado, vinte comandando navios na
Ásia, conheço toda a corporação dos profissionais de bordo... Desembarque
calado se não qui ser ir para o
xadrez...
- Mas paguei minha passagem ...
- Capital bem empregado, já rendeu juros
demais. Então?
- Se o senhor manda... - não discutia, aqui lo fazia parte das regras do jogo de sua vida,
esperaria outro barco para subir até Belém.
Levantava-se Vasco, tomava a peça de
porcelana, retirava-se:
- Boa noite...
- Mas, Comandante, me desculpe, esse
negócio aí, que o senhor vai levando, é meu ...
- Seu? O quê?
- Esse troço bonito .. . Ganhei na
víspora e na pura sorte. Sem batota...
- Sem batota? Pode ser... Mas, isso dá uma
urucubaca danada no poker. Aliás, você já teve a prova... É melhor deixar
comigo.
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