Muito obrigado, só fumo cachimbo |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 79
- Quando eu era rapazola havia uma turca de casa aberta
A salada de frutas, com sua calda
açucarada, quase provoca o desastre. Apenas o comandante engoliu a primeira e
última colherada e foi-lhe necessário todo o carácter para contê-la no
estômago. Havia uma confusão em suas vísceras, uma espécie de desgosto de
viver, um desencanto.
Felizmente a gentil e bonita balzaqui ana não viera ao refeitório. Não teria podido
conversar com ela, não sentia gosto para nada, tudo quanto desejava era o fim
do jantar.
- Quase não comeu, Comandante - o deputado
devorava.
- Não estou passando bem, tive uma
complicação devido a umas cajaranas verdes que comi. Não quero abusar.
- Pensei que estivesse enjoado, imagine.
Um comandante enjoado, que absurdo!
Riram os três da idéia impossível e cómica. Vasco
resolveu não arriscar o café. Esperou, contendo-se, que todos terminassem, para
levantar-se dando por findo o jantar. O deputado tentava retê-lo no tombadilho:
- Se o senhor descobrisse, Comandante,
um desses revolucionários escondido em seu beliche? Que faria? Entregaria à
polícia ou guardaria segredo?
O que faria? Sabia lá como agir num caso
desses? Não se metia em política, desde o fim do governo de José Marcelino e do
assassinato de D. Carlos I, de Portugal e Algarves.
Não queria saber de revolucionários e
revoluções, que se danassem Washington, Júlio Prestes, Getúlio, nada o
impediria agora de voltar urgentemente à sua cabine. Nem a sorridente, criatura
do cachorro, se por ali aparecesse. Queria ficar sozinho, deitado, a cabeça
pousada num travesseiro.
- Desculpe, Doutor. Tenho de assumir meu
posto, na ponte de comando. Ver como marcha a viagem.
- Pois vá e depois volte, vamos
conversar. Estarei no salão de leitura.
Precipitou-se Vasco escada acima, a
chuva açoitava a coberta reservada aos oficiais. Um vulto cruzou em seu caminho
para a cabine.
- Boa noite, Comandante.
Era o médico de bordo, a fumar um
charuto baiano:
- Vai à ponte, dar sua cachimbada? Não
prefere um charuto? Retirava um do bolso da túnica, negro e malcheiroso.
- Muito obrigado, só fumo cachimbo . . .
- O senhor é nascido mesmo na Bahia? .
..
- Sou, sim...
- E não gosta de charutos? É um crime. -
riu.
- Questão de hábito. Desculpe-me, vou
descansar um pouco...
- Ainda tão cedo?
- Tive um dia fatigante . . .
- Pois então, boa noite.
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