terça-feira, maio 06, 2014

Seria um favor prestado à Companhia e aos passageiros...
OS VELHOS
MARINHEIROS


Episódio Nº 72











Na travessia entre Rio e Salvador falecera o comandante, assumira o imediato o comando do barco, mas a lei exigia que, do primeiro porto em diante, até a chegada de um comandante da Companhia fosse o navio conduzido por um outro capitão de longo curso, qualquer um que ali se encontrasse desocupado ou em férias ou já aposentado.

Leis absurdas, como se o imediato não pudesse levar o navio até Belém, onde dispunha a Companhia de outro comandante: um paraense a passar as férias em sua terra, para quem já seguira telegrama.

Ele, o desconhecido, era o Sr. Américo Antunes, representante da Costeira na Bahia, cabia-lhe descalçar aquela bota. Como se já não bastassem as providências para o enterro do comandante falecido...

- Não jogaram o corpo no mar...? - quis saber Zequinha. Antes tivessem jogado, evitar-lhe-iam trabalho e aborrecimentos.

Onde arranjar outro comandante? Fora, como é natural, à Capitania dos Portos, em cujos livros estão inscritos os nomes e os endereços dos capitães-de-longo-curso diplomados pela Capitania.

Quase todos eram comandantes de carta de borracha, sem serventia no mar, estavam para as bandas do São Francisco, nas gaiolas.

Comandante mesmo, com exame completo e trabalho aprovado, só havia um, esse tal Vasco Moscoso de Aragão, de cujo paradeiro nada sabiam na Capitania, e em cujo endereço, no Largo 2 de Julho, não era encontrado.

Descobrira finalmente seu destino actual e vinha convidá-lo a assumir o comando do Ita, levá-lo até Belém, porto final da viagem de ida, onde já o outro comandante estava à espera para a travessia de volta.

Seria um favor prestado à Companhia e aos passageiros, alguns ilustres, inclusive, um senador federal, do Rio Grande do Norte, pois se não houvesse ele descoberto esse providencial comandante, teriam navio e passageiros de esperar três ou quatro dias pela vinda de um outro, do Rio de Janeiro.

Atraso para os passageiros, prejuízo enorme para a Companhia. Chico Pacheco riu ironicamente:

- Pois vão ter de esperar, porque esse comandante não vai levar navio nenhum...  Não vai arredar os pés daqui...

- Não creia nisso - atalhou Zequinha Curvelo. - O comandante ficará feliz com essa oportunidade.

- Feliz ou não - considerou o Sr. Antunes - ele terá de fazê-lo. A lei o obriga. Mesmo que esteja de férias ou aposentado...

Chegavam à porta da casa do comandante, viam-no na sala dos fundos ante a grande janela de vidro, a fitar o mar encapelado.

 Zequinha Curvelo chamou por ele, fez as apresentações, explicando já o caso, esfregando as mãos:

- Agora, Comandante, o senhor vai esmagar essas serpentes.

Os adversários tinham ficado do lado de fora, sob a chuva, apenas Zequinha Curvelo e Emílio Fagundes haviam transposto, com Antunes, a soleira da porta.


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