sábado, maio 03, 2014

Um dia me farão justiça, sentirão a minha falta...
OS VELHOS

MARINHEIROS


Episódio nº 70











Zequinha Curvelo pronunciou apenas uma palavra:

- Covarde!

O desafio dera-se na praça, onde se reuniam os inimigos do comandante, Chico Pacheco perdeu certo terreno junto aos seus admiradores. A perspectiva de um duelo agradava aos dois grupos igualmente, excitava-os.

 Foi, no entanto, passageira essa vantagem do comandante. No fundo, persistia a dúvida, suas histórias já não encontravam aquele eco antigo, já não despertavam o entusiasmo anterior.

O próprio Zequinha Curvelo um dia observou-lhe:

- A verdade é que a invenção desse pulha nunca foi desmentida. 

O comandante fitou-o com seus olhos puros:

- Se eu tiver de buscar provas para defender-me de um covarde que fugiu do campo de honra, se entre a minha palavra e a dele há quem vacile, então prefiro ir-me embora.

Vi, num jornal, o anúncio de uma casa à venda na ilha de Itaparica. Lá, pelo menos, estarei no meio do mar, como se estivesse num navio, longe da infâmia e da inveja.

Levantava a crista caída:

- Um dia me farão justiça, sentirão minha falta. Mas não me rebaixarei a desmentir um pusilânime, um cagão.

Estavam assim as coisas, nesse impasse, quando um fato novo aconteceu e a verdade se impôs. Não dependeu nem do comandante nem de Chico Pacheco, nem de Zequinha Curvelo, de Adriano Meira ou do velho José Paulo, o Marreco, o único a não se exaltar, a conservar seu equilíbrio em meio à tempestade.

Foi o destino, o azar, o acaso, dêem-lhe o nome que melhor lhes pareça.

Quisera eu também a intervenção do destino para afastar as suspeitas crescentes do Meritíssimo Juiz Dr. Alberto Siqueira, algo a provar-lhe a pureza de minhas relações com Dondoca, reflexo apenas da amizade por mim dedicada ao ínclito e desconfiado luminar. Impossível?

 Porque de fato ando ornamentando a testa do Meritíssimo, comendo-lhe os chocolates e a rapariga? Só por isso? Então não sabem ser o destino caprichoso?

Quando intervém para restabelecer a verdade, ele o faz ao sabor de suas simpatias, e não à vista de provas e documentos. Por que não poderia, então, demonstrar ao juiz minha inocência, levando inclusive em conta o serviço por mim prestado ao Meritíssimo, ao substituí-lo no leito de Dondoca?

 Deixo-a pela manhã satisfeita e alegre, disposta assim a aturar, com paciência e sorrisos, a chatice infinita do emérito luminar.

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