sexta-feira, julho 25, 2014

Aquele é Natário, capanga  do coronel Boaventura.
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)



Episódio Nº 10


















Venturinha conseguiu conter a língua, não arrotou demasiada grandeza nem se proclamou o valente dos valentes, não ameaçou céus e terras com a pistola alemã, arma de estimação, uma jóia.

 Nem sequer quando se embebedou no cabaré e quis agarrar a pulso a pernambucana Doralice, rapariga do coronel
Hermenegildo Cabuçu, ausente na ocasião, graças a Deus.

Natário o convenceu a desistir e o levou embora.

No cartório, cujas molas o Coronel azeitara com antecedência, não houve a menor dificuldade para o registo das medições e a entrega das escrituras dos títulos de propriedade que legitimavam a posse da imensa sesmaria do coronel Boaventura Andrade e do pedaço de chão do capitão Natário da Fonseca.

Nas pensões e casas de putas a animação permaneceu intensa, dia e noite. Os jagunços da Fazenda da Atalaia esbanjavam dinheiro; crescia o prestígio do novo chefe político, era Deus nas alturas e o coronel Boaventura na terra.

Ao ver Natário atravessar a Rua do Umbuzeiro, Maria das Dores, sentada no batente da porta da rua, apontou-o com o dedo e esclareceu Zezinha do Butiá, novata vinda de Lagarto:

 - Aquele é Natário, capanga do coronel Boaventura, cabra ruim, mais perverso não existe. Nem ele sabe a conta dos crimes que já cometeu. Pois bem, tu pode não acreditar mas tem mulher que é maluca por ele, Deus me livre e guarde. - Cuspiu com desprezo.

Mulata dengosa, de bunda redonda e peito de rola, Zezinha do Butiá, apesar de recém-chegada, parecia bem informada:

 - Eu soube diferente. Que esse é o capitão Natário, endinheirado, danisco e bom de coração. Diz que nunca maltratou mulher.

Suspirou, faceira, acompanhando Natário com a vista.
Zezinha do Butiá estava, como se diz, na flor da idade e da
formosura, os homens brigavam por ela. Gritou para o molecote ocupado em comer terra:

 - Corre, Manu, atrás do moço que vai ali adiante. Pede a bênção a ele e diz que eu estou esperando ele, pode vir na hora que quiser. Não carece trazer dinheiro.

Para uns, criminoso, cabra desalmado, bandido sem entranhas; para outros, valente capitão, de natural bondoso, bem - querer das damas.

Antes de deixar a fazenda para passar em Ilhéus os últimos dias de férias com a mãe, dona Ernestina, padrão de todas as virtudes, Venturinha quis conhecer o lugar onde se dera a ocorrência.

Desejava ver com os próprios olhos, saber de ciência certa, para poder contar aos colegas de Faculdade e de farra, na Capital, valorizando os detalhes. Natário o conduziu:

 -  Tu vai avistar uma amostra do céu.

Site Meter