(Jorge Amado)
Episódio Nº 20
Sem contar com as futuras roças, a serem plantadas nas terras que acabara de desmatar.
Dava gosto contemplar as mudas de
cacaueiros crescendo vigorosas à sombra húmida das árvores. Os olhos miúdos do
Capitão brilhavam, num açodamento de amoroso, ao comprovar o esmero com que
tinham sido dispostas, as distâncias entre cada uma delas na medida certa, as
covas abertas no rigor do preceito, quase não tivera perdas.
Não
cabia discussão: lavra nenhuma no mundo se compara à do cacau, nenhuma compensa
tanto e tão rapidamente. Plantar cacau é o mesmo que semear ouro em pó para
colher barrotes.
Verdade comprovada, o sorriso abria os lábios,
apertava os olhos do patrão da Boa Vista. Era ter paciência e esperar.
Os alqueires que o coronel Boaventura
Andrade mandara registar em nome do antigo capanga situavam-se perto de Tocaia Grande,
ninguém soube se de propósito, se por coincidência.
Imprudentes especularam sobre o nome dado
por Natário à propriedade, insinuando que ele teria se inspirado na visão do
vale junto ao rio, quando, na distante noite de tempestade, a parabelum na mão,
demorou à espreita: boa vista apesar da escuridão.
A
língua do povo é comprida e afiada, mais comprida ainda a inventiva.
Não adiantava o repetido aviso da
cautelosa maioria: - com diz-ques e falatórios não se ganha nem um tostão
furado e pode-se ganhar um tiro fácil no ricochete das balas vadias atrás dos
pés de pau.
Para que revolver águas passadas se o capanga
já não existia, quem por ali transitava era
Capitão e fazendeiro?
Tocaia Grande ficava a meio caminho
entre a Fazenda da Atalaia e a da Boa Vista, a distância a
cobrir entre os dois destinos não ia além de légua e meia, duas léguas se
muito; em boa montaria, um pulo. Indo ou voltando, o Capitão cruzava sempre pelo
atalho, encurtando o caminho.
Pôde assim acompanhar, atento e participante
quando necessário, a transformação que foi acontecendo.
Tendo sabido dos planos do coronel
Robustiano de Araújo, Natário o aconselhou a construir o
depósito em Tocaia
Grande.
Fazendão sem tamanho, na qual além de
plantar cacau o Coronel criava gado, a Santa Mariana ficava nas nascentes do
rio das Cobras, nos limites da caatinga, muito distante dos trilhos da Estrada de
Ferro.
Motivo por que o Coronel decidira levantar em
sítio apropriado um armazém para nele estocar cacau seco e ali entregá-lo aos
exportadores; eles que se vexassem com o transporte para Ilhéus.
O
fazendeiro se agradou do posto, seguiu o alvitre e tendo se dado bem, já estava
anunciando a construção de um curral onde o gado repousasse na caminhada para
os matadouros de Ilhéus e de Itabuna.
Conselho valioso, o Coronel agradecido mandou
entregar uma novilha ao Capitão.
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