Largo do Seminário, em frente, na cidade de Santarém. |
HOJE É DOMINGO
(Da Minha Cidade de Santarém em 7/9/14)
Continua a austeridade,(os vencimentos dos funcionários públicos vão baixar este mês de Setembro) raiz de todo o mal,
mal de que não podemos fugir porque temos metas orçamentais para cumprir e
juros de dívida para pagar.
Mas
o que mais aflige, a mim e aos meus patrícios, é a falta de esperança, aqui lo de que há muito se convencionou chamar “a luz
ao fundo do túnel”.
Esta espiral de afundamento, da crise
que gera crise, de promessas vagas e diariamente desmentidas que levam ao
desânimo e à descrença, que minam e corroem o espírito, que nos assaltam de noite
sob a forma de fantasmas e transformam o sonos em pesadelos, constitui a
realidade da nossa sociedade.
Os novos pensam e vão embora, em desespero,
os velhos já não pensam nada e os que trabalham tremem na eminência de ficarem
sem emprego.
Ainda estou a ver a imagem na televisão
daquele trabalhador belga que foi despedido com milhares de colegas seus pela
Ford americana instalada no seu país e que, entrevistado, tinha mais vontade de
chorar do que de falar. São estas as imagens que ficam e que nos marcam, a nós
e a uma época.
Sim, não pensem que são só os meus
patrícios que sofrem da crise, do desemprego e do empobrecimento. Não, o mundo é
cada vez mais pequeno e o negócio é comprar e vender, vender e comprar tudo uns
aos outros nesta nossa sociedade global estruturada sobre o consumo, sempre
mais consumo, numa espiral sem fim que por vezes se engasga.
Como diz o Presidente da Argentina, José
Pepe Mujica, «não é o homem que governa hoje, são as forças e os interesses que
estão envolvidos que governam o homem» e numa sociedade em que o consumo é o
motor se este pára a economia pára.
Se as vendas de automóveis baixam de 40 a 50% as fábricas têm de
fechar e os trabalhadores da Ford vão ficar na rua com vontade de chorar como
ficaram em Portugal quando foi da Opel, na Azambuja, há anos, transferida para
países do Leste por causa dos custos mais baixos de mão-de-obra. E o que
dizemos relativamente aos automóveis pode ser dito para todos os bens de
consumo.
Voltando ao Presidente do Uruguai: “Isto
não é um problema económico é um problema político”, e eu acrescento por
palavras minhas: é também pensarmos a nossa vida em novos moldes e desviar a
procura da felicidade no consumir, consumir a todo o custo, para uma outra via que
cada um de nós, consigo e em convívio com os outros, tem de descobrir.
Caminho difícil, muito difícil… mas eu
lembro-me bem que quando era miúdo, menino rico que andava nos estudos e
passava férias na aldeia dos meus avós, encontrava lá pessoas pobres, melhor
dizendo, que não tinham bens.
Nas aldeias ser pobre não era, com
excepção de um outro, ajudado pelos vizinhos menos pobres, um estado, uma
infelicidade, uma desgraça. Era natural.
Na ausência de centros comerciais, ainda
por inventar, com uma miríade de produtos, havia as feiras anuais onde se compravam
umas botas, calças, camisa, aqui lo
de que se precisava e que já tinha sido inventariado há muito. Depois havia
umas guloseimas, ah!... e os colares de pinhões enfiados numa linha.
Não sei se os espaços comerciais de hoje
são as feiras do antigamente mas uma coisa vos garanto: as pessoas que as
frequentavam pareciam aos meus olhos de criança e a esta distância a que falo,
sessenta e muitos anos depois, mais felizes e alegres do que aquelas que agora
vejo. Havia, então, um brilho nos olhos, uma curiosidade, um perscrutar que
contracenam com a indiferença de hoje.
No entanto, verdade se diga, foi o muito
consumo que gerou este enorme crescimento. O mundo rural, durante tantos séculos
base da vida e da riqueza na sociedade, caiu aos pés da industrialização, da máqui na a vapor e do motor de explosão e no espaço de
duas ou três gerações, a partir do século XIX, as cidades irromperam pujantes
para o bem ou para o mal.
Eu, que sou de Lisboa, de num bairro a
oriente, num extremo, lá no Poço do Bispo, já depois de se passar por Alfama e
Mouraria, Xabregas e Beato, vi crescer a minha cidade, cresci com ela,
acompanhei-a, saí do bairro em que nasci e fui para as Avenidas Novas que
estavam a nascer e que acabaram por engolir o aeroporto que tinha entrado em
funcionamento em 1942, três anos depois de eu ter vindo ao mundo.
Pode ser que a crise que vamos
atravessar seja apenas cíclica, passageira, que daqui
por uns anos assistamos novamente a um recrudescimento da economia e do emprego
que nos permita voltar à felicidade do consumo.
Pode
ser… pode ser que a Europa retome nas suas mãos o seu destino... pode ser que a
Alemanha, o tal país “que é demasiado grande para a Europa e demasiado pequeno
para o mundo” (Kissinguer), o permita.
Se assim for, não teremos que reinventar
uma nova forma de viver, um outro tipo de vida, uma outra maneira de tentar ser
feliz.
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