Quando se fala da dívida do país, e quase não se fala de
outra coisa que não seja de dívidas, seja do país, a soberana, ou das autarqui as ou de qualquer outra instituição, vem-me logo à
memória o meu falecido pai.
Sentado à noite à lareira, fumava cigarro atrás de
cigarro que acendia numa brasa, olhava fixamente o fogo crepitante e suspirava
num desalento permanente.
O pouco dinheiro que sobrava do negócio da criação dos
frangos era para pagar ao Banco as letras que se iam vencendo e que ele não
conseguia mais do que reformar por inteiro: os juros eram sagrados, a dívida
continuava.
Uma vida inteira a trabalhar e a fazer malabarismos
junto dos amigos para arranjar dinheiro para levar para o Banco naquelas datas
precisas gravadas numa agenda, não para pagar a dívida mas para a manter,
eternizá-la num círculo infindável que só acabaria com a morte do credor.
Primeiro, foi aquele sobreiro imponente, quantos anos
teria (?)... com a desculpa que atrapalhava no caminho.
Ainda hoje
consigo ouvir o som rouco das suas raízes rebentando debaixo da terra incapazes
de resistir à força das correntes que lhe puxavam os braços.
Depois, mais tarde, aquela pinheira enorme, chamo-lhe
pinheira porque dava pinhas que eu, rapaz, abria ao fogo da lareira para saborear os
melhores pinhões que já comi, nem os comprados na feira enfiados numa linha os
suplantavam.
Acabados de abrir
guardavam a totalidade do seu sabor, a marca pura da árvore que era como um
marco a meio daquela encosta, do lado esquerdo antes de chegar à aldeia.
Durante muitos anos não olhava para lá para evitar a tristeza
de a não ver.
Finalmente, a dívida, depois do sobreiro e da pinheira,
matou o meu pai. Levantou-se da sua cadeira de palhinha depois de ter atirado a
ponta do cigarro para o fogo já quase apagado, terá suspirado mais uma vez e
foi deitar-se.
Adormeceu e não mais acordou, o coração não resistiu a
tantos suspiros. Dizia-se que elas não matam mas moem mas ás vezes matam mesmo... "bem feito" para o Banco, "bem feito" para a dívida.
E o país, o nosso país, também irá morrer como o meu pai
por causa da dívida?
O Passos Coelho e
a sua ministra das Finanças mentem muito para nos deixarem descansados. Prestes
a serem rendidos como intérpretes deste filme terão muitos anos para assistirem
no sofá à continuação do drama da dívida.
António Costa olha para a Europa com uma réstia de
esperança e pergunta:
- Porque se fala
da dívida de Portugal, da Grécia, e não da dívida da Europa?
A reestruturação da dívida é necessária e indispensável
mas é do conjunto da zona euro.
Portugal não pode assumir sozinho a reestruturação da
sua dívida e ainda por cima anunciá-lo porque a reacção imediata dos mercados torná-la-ia
insustentável.
Ao contrário do meu pai, para o bem ou para o mal, o país não morre.
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