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CRENÇAS RUINS
Por que razão é tão difícil
erradicar crenças ruins?
- A razão tem a ver com a natureza das próprias crenças que estão
biologicamente preparadas para serem resistentes à mudança porque foram
designadas para aumentar a nossa habilidade de sobreviver.
Para mudar as crenças os cépticos devem aceder às habilidades de
sobrevivência do cérebro discutindo os significados e as implicações para além
dos dados.
Uma noção básica do espírito crítico e científico é de que as crenças
estão erradas e por isso, é muitas vezes confuso e irritante para cientistas e
cépticos que as crenças de tantas pessoas não mudem diante de evidências
contraditórias.
Perguntamo-nos como é que as pessoas acreditam em coisas que contradizem
os factos?
Essa confusão pode criar uma terrível tendência da parte dos pensadores
cépticos de diminuir e menosprezar as pessoas cujas crenças não mudam face às
evidências.
Elas podem ser olhadas como inferiores, estúpidas ou até malucas. Esta
atitude, resulta de uma falha dos cépticos ao não compreenderem o propósito
biológico das crenças e a necessidade neurológica de que elas sejam resistentes
à mudança.
A verdade é que, por causa do seu pensamento rigoroso, muitos cépticos
não têm uma compreensão clara ou racional do que são as crenças e por que,
mesmo as mais erradas, não desaparecem facilmente.
Entender o propósito biológico das convicções pode ajudar os cépticos a
serem muito mais eficientes no desafio às crenças irracionais e na divulgação
de conclusões científicas.
Embora faça muito mais do que isso a finalidade primária dos nossos
cérebros é manter-nos vivos e a sobrevivência irá ser sempre o seu principal
propósito e virá sempre em primeiro lugar.
Se formos ameaçados ao ponto dos nossos corpos ficarem apenas com energia
suficiente para suportar a consciência ou o coração a bater mas não as duas
coisas em simultâneo, o cérebro não tem problema em “apagar-se” e colocar-nos
em coma (sobrevivência à frente da consciência) em vez de ficar alerta até à
morte (consciência à frente da sobrevivência).
Como cada actividade do cérebro serve fundamentalmente para isso, a única
maneira de entender precisamente qualquer função cerebral é examinar o seu
valor como instrumento de sobrevivência.
Mesmo a dificuldade de tratar desordens comportamentais como a obesidade
e vícios pode ser entendida examinando a sua relação com a sobrevivência.
Qualquer redução no consumo calórico ou na disponibilidade de uma
substância na qual um indivíduo é viciado é sempre interpretada pelo cérebro
como uma ameaça à sobrevivência e o resultado disso é que o cérebro defende-se
criando aquelas reacções típicas da síndrome da abstinência.
As ferramentas primárias do cérebro para garantir a nossa sobrevivência
são os sentidos. Obviamente, devemos ser hábeis em perceber com precisão o
perigo para podermos tomar atitudes que nos mantenham em segurança.
Para sobreviver temos que ver o leão à saída da caverna e ouvir o intruso
invadindo a nossa casa a meio da noite.
Apesar disso, os sentidos sozinhos são inadequados como detectores do
perigo porque são limitados no alcance e na área. Nós só podemos ter contacto
sensorial directo com uma pequena porção do mundo de cada vez.
O cérebro considera esse um problema significativo porque, mesmo o
dia-a-dia, requer que estejamos constantemente em movimento, dentro e fora do
nosso campo de percepção do mundo como é agora.
Entrar num território que nós nunca vimos ou ouvimos coloca-nos na
perigosa posição de não termos nenhuma noção dos perigos possíveis. Se entrar
num prédio desconhecido ou numa parte perigosa da cidade, as minhas chances de
sobrevivência diminuem porque não tenho como saber se o teto está para cair na
minha cabeça ou se um atirador está escondido atrás da porta.
É aqui que entra a crença. Crença é o nome que damos à ferramenta
de sobrevivência do cérebro que existe para aumentar a função de identificação
de perigos dos nossos sentidos.
As crenças estendem o alcance dos nossos sentidos de maneira que podemos
detectar melhor o perigo e aumentar as nossas chances de sobrevivência em
território desconhecido. Em essência, elas servem-nos como detectores de perigo
de longo alcance.
Do ponto de vista funcional, os nossos cérebros tratam as crenças como
“mapas” da parte do mundo que não podemos ver no momento.
Enquanto estou sentado na minha sala de estar não posso ver o meu carro.
Apesar de o ter estacionado na minha garagem há algum tempo, se eu usar os
dados sensoriais imediatos, eu não sei se ele ainda lá está, por isso, neste
momento os dados sensoriais não são de grande utilidade para encontrar o meu
carro.
Para que eu encontre o meu carro com algum grau de eficiência, o meu
cérebro deve ignorar a informação sensorial actual e voltar-se para o seu
“mapa” interno do local do meu carro.
Esta é a minha crença de que o carro ainda está no local onde o deixei.
Se me referir à minha crença em vez de aos dados sensoriais, o meu cérebro pode
“saber” alguma coisa sobre o mundo com o qual não tenho contacto imediato.
Esta faculdade “estende” o conhecimento e o contacto do cérebro com o
mundo para além do alcance dos nossos sentidos imediatos aumentando as nossas
possibilidades de sobrevivência.
Um homem das cavernas tem mais hipóteses de sobreviver se acreditar que o
perigo existe na floresta embora ele não o veja, da mesma forma que um polícia
estará mais seguro se acreditar que alguém parado por infracção de trânsito
pode ser um psicopata armado embora tenha aparência de boa pessoa.
Tanto os sentidos como as crenças são ferramentas para a sobrevivência e
evoluíram para se alimentarem um ao outro e, por isso, o nosso cérebro
considera-os separados mas igualmente importantes como fontes de informação
para a sobrevivência.
A perda de qualquer um deles coloca-nos em perigo. Sem os nossos
sentidos não poderíamos conhecer o mundo perceptível e sem as nossas crenças
nada poderíamos saber do que está fora dos nossos sentidos, nem sobre
significado, razões e causas.
Isto significa que as crenças existem para operar independentemente dos
dados sensoriais.
Na verdade, todo o valor das crenças para a sobrevivência baseia-se na
sua capacidade de persistirem não obstante as evidências em contrário.
As crenças não devem mudar facilmente ou simplesmente por causa de
evidências que as neguem. Se elas o fizessem não tinham nenhuma utilidade para
a sobrevivência. O nosso homem das cavernas não duraria muito se a sua crença
em perigos potenciais na floresta se evaporasse toda a vez que ele não visse
esses perigos.
Para o cérebro não há absolutamente nenhuma necessidade que os dados e as
crenças concordem entre si. Cada um delas evoluiu para aumentar e melhorar a
outra pelo contacto com diferentes secções do mundo.
Foram preparadas para poderem discordar e por isso é que cientistas podem
acreditar em Deus e pessoas que são geralmente razoáveis e racionais podem
acreditar em coisas sem evidências dignas de crédito como discos voadores,
telepatia ou psicocinese.
Quando dados e crenças entram em conflito o cérebro não dá preferência
aos dados e é por isso que crenças, mesmo disparatadas, ruins, irracionais ou
loucas, raramente desaparecem diante de evidências contraditórias.
O cérebro não se importa se a crença concorda com os dados, ele apenas se
preocupa se a crença ajuda à sobrevivência e ponto final.
Então, enquanto a parte racional e científica do nosso cérebro pode
pensar que os dados deviam confirmar a crença, a um nível mais profundo ele nem
liga a isso. Ele é extraordinariamente reticente em reavaliar as suas
convicções.
E como um velho soldado com o seu revólver que não acredita que a guerra
acabou, também o cérebro se recusa a entregar as armas mesmo que os factos
desmintam aqui lo em que ele crê.
Mesmo as crenças que não parecem, estão intimamente ligadas á
sobrevivência porque as crenças não ocorrem individualmente ou no vácuo. Elas
relacionam-se umas com as outras formando uma rede que cria a visão do mundo
fundamental do cérebro e daqui a
importância de manter intacta essa rede.
Pequenas que sejam e aparentemente sem importância, qualquer pequena
convicção é defendida até ao fim.
Por exemplo, um criacionista não pode tolerar a precisão dos dados que
indicam a realidade da evolução, não por causa dos dados em si mas porque mudar
qualquer crença relacionada com a Bíblia e a natureza da criação, quebrará todo
um sistema, uma visão do mundo e, em última análise, a experiência de
sobrevivência do seu cérebro.
O que está em causa, portanto, é uma questão de valor da sobrevivência da
credibilidade e, perante ela, as evidências negativas são insuficientes para
mudar as crenças mesmo em pessoas inteligentes em outros assuntos.
Em primeiro lugar, os cépticos não devem esperar mudanças de crença
simplesmente como resultado dos dados ou pensar que as pessoas são estúpidas
porque não mudam de ideias.
Devem evitar tornarem-se críticos ou arrogantes como resposta à
resistência à mudança. Os dados são sempre necessários mas raramente
suficientes.
Em segundo lugar, os cépticos devem aprender a nunca ficarem só pelos
dados mas discutirem também as implicações que a mudança dessas crenças podem
ter na visão do mundo e no sistema de convicções das pessoas envolvidas.
Os cépticos devem acostumar-se a discutir a filosofia fundamental e a
ansiedade existencial que se estabelece quando crenças profundas são abaladas.
A tarefa é tão filosófica e psicológica quanto científica.
Em terceiro lugar, e talvez a mais importante, os cépticos devem perceber
quanto difícil é para as pessoas verem as suas convicções abaladas. É, quase
literalmente, uma ameaça ao senso de sobrevivência dos seus cérebros.
É perfeitamente normal que as pessoas fiquem na defensiva em situações
como essas. O cérebro acha que está lutando pela sua própria vida.
A lição que os cépticos devem aprender é que as pessoas, geralmente, não
têm a intenção de serem teimosas, irracionais, nervosas, grosseiras ou
estúpidas, quando as suas convicções são ameaçadas.
É uma luta pela sobrevivência e a única maneira de lidar, efectivamente,
com esse tipo de comportamento defensivo é amenizar a luta em vez de
inflamá-la.
Os cépticos só podem pensar em ganhar a guerra pelas convicções racionais
se continuarem, mesmo contra respostas defensivas, mantendo um comportamento
digno e respeitoso que demonstre respeito e sabedoria. Para que os argumentos
científicos se imponham, os cépticos devem manter sempre o controle e não se
irritarem.
Finalmente, o que deve servir de consolo
é que a parte realmente fantástica disto, não é que somente algumas crenças se
modifiquem ou que as pessoas sejam tão irracionais, mas sim que as crenças de
qualquer um podem modificar-se.
A habilidade que os cépticos demonstraram
em alterar as suas próprias convicções a partir das descobertas científicas,
constituiu um verdadeiro dom; uma capacidade poderosa, única e preciosa, só
possível por uma alta função do cérebro na medida em que vai contra algumas das
urgências biológicas mais fundamentais.
Eles possuem uma aptidão que pode ser
assustadora, modificadora e que causa dor. Ao projectarem nos outros essa
habilidade devem ser cuidadosos e sábios.
As convicções devem ser desafiadas com
cuidado e compaixão.
Os cépticos não devem perder de vista os
seus objectivos, devem adoptar uma visão de longo prazo, tentarem vencer a
guerra pelas crenças racionais, não entrarem numa luta até à morte.
Não são só os dados e os métodos dos
cépticos que têm que ser limpos, directos e puros, mas também a sua conduta e
comportamento.
NOTA - Não sei se o comportamento dos radicais islâmicos se inscreve neste capítulo das crenças ruins. Penso que o Prof. não estaria a pensar neles mas apenas nas crenças religiosas, ruins em si mesmas e que podem degenerar nestes extremos. Por vezes, chego a desconfiar se a crença religiosa não passa de um pretexto para levar a cabo uma guerra sem limites para conseguir o poder...
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