quarta-feira, fevereiro 25, 2015

Nando mercadejava passarinhos
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 183




















Pertencia pois ao passado o domingo em que na canoa cavada no tronco de vinhático, novinha em folha, o jovem Aurélio e a moçoila Diva atravessaram o rio trazendo minguados produtos para vender a quem os quisesse comprar.

 Os primitivos habitantes viram expostos sobre sacos de aniagem o que jamais tinham visto à venda em Tocaia Grande: vagens, chuchus, quiabos, maxixes, jilós e abóboras, tudo em reduzida quantidade.

 Houve quem se recusasse a acreditar nos próprios olhos. A cada semana ampliavam-se a variedade e a quantidade das
mercadorias; o Turco Fadul saudara com alvoroço as primeiras mãos de pimenta: as de cheiro, redondas e amarelas, as malaguetas, compridas, pintalgadas de verde e de vermelho.

Nando mercadejava passarinhos. Ele e Edu, sócios em reinações, armavam arapucas na mata povoada de papa-capins, sabiás, bem-te-vis, andorinhas, lavadeiras, curiós; fabricavam rústicas gaiolas.

Na oficina de Tição, um pássaro sofrê ruflando as plumas inflava o peito no canto e no assovio. Apenas Lia demorara a acocorar-se em frente ao barracão para ajudar na feira.

Quando - ainda outro dia ou lá vai tempo? - viram-na ao lado do marido, dos sogros e cunhados, ela trazia ao colo e amamentava em meio ao varejo um recém-nascido chorão e gordo.

Logo as famílias de José dos Santos e de Altamirando se incorporaram à de Ambrósio expondo a colheita da semana. Cão corria atrás dos baés, embalava bacorinhos como se fossem criancinhas: nos rasgões do vestido os seios amadureciam.

Com Edu e Nando cortava o vale em disparada. As pernas finas, o cabelo em caracóis, o riso imoderado, o olhar incerto, desbocada.

Bravia e atrevida. A incipiente feira atraía, além dos moradores, mateiros e alugados das propriedades próximas. Vinham comprar legumes e verduras inexistentes nas fazendas onde a terra, quanta houvesse, se destinava exclusiva ao cultiva do cacau.

Um pedaço de abóbora para cozinhar no feijão; chuchu, jilós e maxixes para fazer um guisado e comer com carne-seca. Mas vinham também pelo passeio ao povoado, em busca de diversão, festa e mulher.

 Havia quem trouxesse violão e cavaquinho; Lico Carapeba soprava música numa gaita de boca, um dom de Deus. Na oficina, o pássaro sofrê retomava a melodia.

Ampliava-se o contingente das raparigas, multiplicavam-se os casebres, antes esparsos, avizinhando-se em travessas e becos movimentados e ruidosos.

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