Nando mercadejava passarinhos |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 183
Pertencia pois ao passado o domingo em
que na canoa cavada no tronco de vinhático, novinha em folha, o jovem Aurélio e
a moçoila Diva atravessaram o rio trazendo minguados produtos para vender a
quem os qui sesse comprar.
Os primitivos habitantes viram expostos sobre
sacos de aniagem o que jamais tinham visto à venda em Tocaia Grande :
vagens, chuchus, qui abos, maxixes, jilós
e abóboras, tudo em reduzida quantidade.
Houve quem se recusasse a acreditar nos
próprios olhos. A cada semana ampliavam-se a variedade e a quantidade das
mercadorias; o Turco Fadul saudara com
alvoroço as primeiras mãos de pimenta: as de cheiro, redondas e amarelas, as
malaguetas, compridas, pintalgadas de verde e de vermelho.
Nando mercadejava passarinhos. Ele e
Edu, sócios em reinações, armavam arapucas na mata povoada de papa-capins,
sabiás, bem-te-vis, andorinhas, lavadeiras, curiós; fabricavam rústicas
gaiolas.
Na oficina de Tição, um pássaro sofrê ruflando
as plumas inflava o peito no canto e no assovio. Apenas Lia demorara a
acocorar-se em frente ao barracão para ajudar na feira.
Quando - ainda outro dia ou lá vai
tempo? - viram-na ao lado do marido, dos sogros e cunhados, ela trazia ao colo
e amamentava em meio ao varejo um recém-nascido chorão e gordo.
Logo as famílias de José dos Santos e de
Altamirando se incorporaram à de Ambrósio expondo a colheita da semana. Cão corria
atrás dos baés, embalava bacorinhos como se fossem criancinhas: nos rasgões do
vestido os seios amadureciam.
Com Edu e Nando cortava o vale em disparada. As pernas
finas, o cabelo em caracóis, o riso imoderado, o olhar incerto, desbocada.
Bravia e atrevida. A incipiente feira
atraía, além dos moradores, mateiros e alugados das propriedades próximas. Vinham
comprar legumes e verduras inexistentes nas fazendas onde a terra, quanta
houvesse, se destinava exclusiva ao cultiva do cacau.
Um pedaço de abóbora para cozinhar no
feijão; chuchu, jilós e maxixes para fazer um guisado e comer com carne-seca.
Mas vinham também pelo passeio ao povoado, em busca de diversão, festa e
mulher.
Havia quem trouxesse violão e cavaqui nho; Lico Carapeba soprava música numa gaita de
boca, um dom de Deus. Na oficina, o pássaro sofrê retomava a melodia.
Ampliava-se o contingente das raparigas,
multiplicavam-se os casebres, antes esparsos, avizinhando-se em travessas e
becos movimentados e ruidosos.
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