O A 320 |
O Voo do A 320
Entro dentro de um avião com a mesma naturalidade e
confiança com que adqui ro uma aposta
de 2 euros para ganhar o jacpot do euromilhões.
Aquele avião não irá cair e o boletim acabado de
comprar não irá dar-me qualquer prémio e, no entanto, o prémio irá sair a alguém,
esse ou o seguinte, e os aviões estatelam-se no chão ou desaparecem nas
profundezas dos oceanos.
Relativamente ao perigo que hoje representa andar de
avião o nosso instinto de sobrevivência terá recuado tanto quanto a nossa esperança
avançou na ideia de um dia sermos ricos.
Estamos sempre no domínio do possível que desprezamos
no caso dos aviões e valorizamos quando se trata de nos habilitarmos ao prémio
do muito dinheiro.
Funcionamos conforme nos convém, entendem? Acreditar, nem
que seja remotamente, no que nos favorece, alimenta-nos o espírito mas
desprezar o perigo, também ele remoto, torna-nos valentes. Desafiar a morte é
alucinante. Descolar dentro daquela imensa caixa de ferro é um desafio.
Já andei, ao longo da vida, em muitas espécies de avião,
desde o T2, o piloto à frente e eu a trás tapados por uma tampa oval
transparente, às avionetas Dornier tão familiares aos militares da guerra de
Angola e que voavam fazendo fintas às nuvens até chegar ao destino, helicópteros
e ao saudoso Super-Constelation da TAP que em 1963 me trouxe de Luanda a Lisboa
em 17 horas e no qual comi ao almoço o melhor esparregado da minha vida.
Nunca me ocorreu, em qualquer um deles, que pudesse
morrer num desastre pela mesma razão que nenhuma das vítimas da queda do A 320
também não pensou.
É tão vulgar e banal andar de avião que o primeiro
sentimento de quem vai morrer num desastre desses, deverá ser de surpresa... como
é possível?...
Penso que será a mesma surpresa, do “como é possível”... ao vermos o número da nossa aposta no euromilhões estampada nos jornais.
Penso que será a mesma surpresa, do “como é possível”... ao vermos o número da nossa aposta no euromilhões estampada nos jornais.
Hoje em dia, o avião, dizem os donos e os
pilotos das companhias da aviação comercial e confirmam as estatísticas, é o transporte mais seguro de quantos existem, ou
seja, dividindo o número de pessoas que se fazem transportar de avião pelo número
dos que são vítimas de desastres aéreos, encontraremos o quociente mais pequeno
de todos os meios de transporte.
No entanto, ninguém liga às pessoas que morrem em desastres
de automóvel e só em Portugal, no ano de 2013, foram 40. 450 deixando de fora os
feridos que raramente existem nos desastres de avião.
Tirando um notável ou outro alguém falou deles? Disseram
os seus nomes? Contaram coisas das suas vidas? – Não. Apenas um número para a estatística, uma coisa fria, que
no tempo da guerra colonial até dava muito jeito ao governo para menosprezar o
seu impacto realçando que até morria muito mais gente nas estradas nacionais. É
isso, não passavam de "gente"...
As vítimas do A 320 viram os seus nomes e as suas
vidas relatadas nos jornais de todo o mundo e tiveram as honras de três Chefes de
Estado.
Não somos iguais à nascença nem quando morremos... especialmente se for de avião.
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