Ocê tá em sua casa... |
TOCAIA
GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio
Nº 234
Mestre Bastião não dava tréguas, sempre às
voltas com Vanjé e com Ambrósio, almoçando na obra todos os dias, elogiando
tempero e passadio, indo com os homens nos fins de tarde conversar fiado no
cacete armado, bebericar cachaça, como se já fosse da família.
Tição
ficava a espiar de longe, a puxar conversa quando a via brincando com Alma
Penada nas proximidades da ferraria, aparecendo no rio na hora em ela se
banhava.
-
Quer que eu vá buscar na oficina?
-
Ocê sabe que só entrou lá no dia que chegou e mais? Até parece que tem medo.
-
Medo de quê? - Desatou a rir, o mesmo riso estabanado do dia em que confundira
o negro Castor Abduim com o Turco
Fadul
Abdala: - Hoje mesmo vou buscar.
22
Ao cair da tarde, Diva cumpriu o
prometido. Parou na portada tenda do ferreiro, olhou para dentro, a forja
estava acesa mas de Castor nem rastro nem notícia. Deu um passo à frente,
entrou, espiou em torno, viu o peji.
Na distante tarde da chegada, não reparara
em nada além do negro de torso nu, a pele sebosa do porco-do-mato pendente da
cintura.
Quatro pratos com comida, peças de
ferro, de madeira, de palha e de metal, feitiçaria. Olhava fascinada.
Inesperadamente sentiu o mesmo cheiro
forte e penetrante que a envolvera na rede, na noite única, sem igual e sem
comparação, em que embarcou no paquete da lua e seu corpo sangrou.
Soube, antes de tê-lo visto, que ele
acabara de chegar. Voltou-se lentamente: Castor, um riso só, falou:
- Ocê tá em sua casa.
Que queria ele dizer com isso? Diva não
perguntou, cadê coragem?
Tição andou para um canto entre as
paredes onde estavam dispostos aqueles estranhos, deslumbrantes objetos.
Curvou-se reverente, com as pontas dos dedos da mão direita tocou a terra antes
de estender-se de bruços no chão para beijar a pedra na cerimônia do icá.
Levantou-se e tomando de uma das peças,
nova em folha, reluzente, dirigiu-se para Diva. Ela sentia-se simultaneamente
ansiosa e assustada, envolta numa atmosfera de mistério bruxaria.
Estendeu a mão, a medo, Castor lhe
entregou o abebê: nos olhos do ferreiro brilhava uma luz forte e vermelha, luz
ou chama, brasa ardente.
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