quarta-feira, abril 29, 2015

É o leque de Iemanjá. Nunca ouviu falar?
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 233


















Nessas bandas a gente tem que saber de um tudo, o oficio só não chega. Acabando essa empreitada, vou virar carpina, vou ajudar no pontilhão.

Era bem falante e cativava quem com ele tratasse, homem ou mulher:
 - Depois que a gente terminar o pontilhão, quero fazer a casa nova de dona Vanjé. Pra tirar ela do buraco onde tá morando.

Não é mesmo, minha velha?

Riram-se os dois, a velha e o mestre pedreiro ao anúncio do projeto. Bastião da Rosa puxou Vanjé para junto de si e a abraçou:

- Gente boa tá aqui, Tição.

Um finório, Bastião da Rosa, ladino como ele só. De olhos azuis, cabelos loiros, igual a um gringo. E daí? Nem por isso, Tição iria desistir, meter o rabo entre as pernas e cair fora.

Dispunha-se a perguntar por Diva quando deu com ela quase à sua frente, carregando uma pedra na cabeça: sustentava-a com as mãos. Suada, o rosto esfogueado, ainda mais bonita!

Ao ver Castor, estancou o passo e sorriu. Tição levantou-se na intenção de ajudá-la.

- Precisa não. Descarregou a pedra junto à obra, limpou o suor com as costas da mão, veio para onde o negro estava:

- Ocê por aqui? É novidade. - Arrodilhou-se a seu lado.

- Vim pra lhe ver. Fiz um abebê pra lhe dar.

- Que é que é?

- É o leque de iemanjá. Nunca ouviu falar?

Nunca. Ouvia pela primeira vez e não sabia o que fosse. Seus santos eram outros, os santos da Igreja, desembarcados da Europa na proa das caravelas. Em Sergipe misturavam-se nos engenhos e nos canaviais com os deuses de Tição, chegados da África no porão dos navios negreiros. Diva porém pouco sabia dessas transas e mistérios.

- Leque... Nunca tive.

Um leque de verdade, semelhante àqueles que as senhoras ajoelhadas nos genuflexórios exibiam com graça e elegância nas missas dominicais em Maroim? Tivera abanos de palha, numerosos: serviam para aliviar o calor do rosto e para aviventar o fogo.

- Cadê?

- Tá na oficina. Pode ir buscar na hora que quiser.

Diva levantou os olhos para o negro, pensativa. Não lhe escapava - e como poderia lhe escapar a não ser que fosse burra e tola além de todas as medidas - o interesse de Tição e de Bastião da Rosa, um e outro a rondá-la, pisando em cima de seus passos, esbanjando olhares e sorrisos.

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