sexta-feira, maio 08, 2015

Vou pra casa de Tição. Vou viver com ele.
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 240


















Amigação, palavra feia. Mas, que podia fazer? Pedir a Bastião que esperasse? Até quando? Diva não era a única na idade de homem a se exibir no povoado.

 A mais velha de Zé dos Santos, a zarolha Ricardina, vivia arreganhando as partes para uns e outros, ainda não estava de porta aberta na Baixa dos Sapos de medo do pai que a queria ajudando no roçado.

As mais moças, Isaura e Abigailque bonitonas, andavam as duas de olho no mestre pedreiro, cada qual mais sem-vergonha. Todos sabiam em Tocaia Grande que Bastião da Rosa caiara sala e quarto, cavara cisterna e construíra fogão no sentido de botar mulher em casa e viver com ela.

Pretendentes às pencas: bastaria ele estalar os dedos para que as moças e raparigas acorressem, afanosas. Não estavam em Maroim.

Em Tocaia Grande nem igreja nem padre, como pensar em casamento?

Perdida em tais melancolias, quando Vanjé deu de si Diva tinha sumido. Não carece casar, concordara ela, tirando-lhe um peso de cima do peito: imagine se não aceitasse!

Bastião da Rosa, numa prova de consideração, pedira consentimento a Ambrósio e a Vanjé para no domingo, terminada a feira, levar Diva para casa no Caminho dos Burros. Se fosse em Maroim... Não era. Seja o que Deus quiser. Suspirou ainda uma vez.

As sombras do crepúsculo se adensaram, escurecendo o rio e as plantações: no vale, a noite tombava de repente. Diva desceu os rústicos degraus, um amarrado na mão, veio até Vanjé imóvel no mesmo lugar onde a deixara:

- A bênção, Mãe.

- Onde tu vai? — Para a casa de Bastião, havia de ser.

- Vou embora, Mãe.

- Bastião marcou pra domingo, depois da feira. Não corre pressa.

 - Vou pra casa de Tição. Vou viver com ele.

25

As primeiras estrelas, pálidas no céu de cinza. No descampado as primeiras tropas, os homens cobrindo as cabeças e as cargas com sacos de aniagem. Sob o barrufo, na mão a trouxa com os teréns, Diva atravessou o rio, dirigiu-se para a tenda do ferreiro, oficina e moradia.

Fogão de lenha não tinha com certeza, tinha a forja e um braseiro onde cozinhar o de-comer. Espelho, não sabia.

No amarrado levava o leque de metal, podia nele se mirar, era espelho e retrato, invenção de negro feiticeiro. Sorriu ao pensar...

Ela o quisera e desejara desde que, ao chegar a Tocaia Grande, imunda de poeira e lama, morta de cansaço, nele pusera os olhos: a cara risonha e larga, o torso nu, a pele de porco na cintura, escondendo as partes.

Pensara encontrar um turco, encontrara seu homem. Na rede, noite, o cheiro poderoso - a inhaca, o aroma, a catinga, o perfume - a invadira, corpo e alma, e a fizera mulher: foi dele antes de conhecer-lhe o peso e o gosto da estrovenga.

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