Vou pra casa de Tição. Vou viver com ele. |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 240
Amigação,
palavra feia. Mas, que podia fazer? Pedir a Bastião que esperasse? Até quando?
Diva não era a única na idade de homem a se exibir no povoado.
A mais velha de Zé dos Santos, a zarolha
Ricardina, vivia arreganhando as partes para uns e outros, ainda não estava de
porta aberta na Baixa dos Sapos de medo do pai que a queria ajudando no roçado.
As mais moças, Isaura e Abigailque bonitonas,
andavam as duas de olho no mestre pedreiro, cada qual mais sem-vergonha. Todos
sabiam em Tocaia Grande
que Bastião da Rosa caiara sala e quarto, cavara cisterna e construíra fogão no
sentido de botar mulher em casa e viver com ela.
Pretendentes às pencas: bastaria ele
estalar os dedos para que as moças e raparigas acorressem, afanosas. Não
estavam em Maroim.
Perdida em tais melancolias, quando
Vanjé deu de si Diva tinha sumido. Não carece casar, concordara ela,
tirando-lhe um peso de cima do peito: imagine se não aceitasse!
Bastião da Rosa, numa prova de
consideração, pedira consentimento a Ambrósio e a Vanjé para no domingo,
terminada a feira, levar Diva para casa no Caminho dos Burros. Se fosse em Maroim... Não era.
Seja o que Deus qui ser. Suspirou
ainda uma vez.
As sombras do crepúsculo se adensaram,
escurecendo o rio e as plantações: no vale, a noite tombava
de repente. Diva desceu os rústicos degraus, um amarrado na mão, veio até Vanjé
imóvel no mesmo lugar onde a deixara:
- A bênção, Mãe.
- Onde tu vai? — Para a casa de Bastião,
havia de ser.
- Vou embora, Mãe.
- Bastião marcou pra domingo, depois da
feira. Não corre pressa.
- Vou pra casa de Tição. Vou viver com
ele.
25
As primeiras estrelas, pálidas no céu de
cinza. No descampado as primeiras tropas, os homens cobrindo as cabeças e as cargas
com sacos de aniagem. Sob o barrufo, na mão a trouxa com os teréns, Diva
atravessou o rio, dirigiu-se para a tenda do ferreiro, oficina e moradia.
Fogão de lenha não tinha com certeza,
tinha a forja e um braseiro onde cozinhar o de-comer. Espelho, não sabia.
No amarrado levava o leque de metal,
podia nele se mirar, era espelho e retrato, invenção de negro feiticeiro.
Sorriu ao pensar...
Ela o qui sera
e desejara desde que, ao chegar a Tocaia Grande, imunda de poeira e lama, morta
de cansaço, nele pusera os olhos: a cara risonha e larga, o torso nu, a pele de
porco na cintura, escondendo as partes.
Pensara encontrar um turco, encontrara seu
homem. Na rede, noite, o cheiro poderoso - a inhaca, o aroma, a catinga, o
perfume - a invadira, corpo e alma, e a fizera mulher: foi dele antes de
conhecer-lhe o peso e o gosto da estrovenga.
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