quarta-feira, junho 17, 2015

Gosto de comer um cozido de sustância
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)


Episódio Nº 268




















Controlava o nervosismo e o medo, somente conseguia encontrar a calma necessária ao chegar ao local e assumir o mando da pugna: ela de um lado, do outro a morte.

Na ocasião o sobressalto, o aperto no coração era ainda maior, pois, não passando das três da tarde, tinha-se a impressão de que um prolongado crepúsculo, feio e triste, se abatera sobre Tocaia Grande.

Vamos, concordou sorrindo a fim de acalmar Tarcísio.

Cobriu a cabeça com um saco e lá se foi fazer o parto de Zeferina. O oitavo da seara iniciada com Guaraciaba, a tamanqueira: o nono levando em conta que o de Dinorá fora de gêmeos em noite de prodígio e maravilha!

As rajadas de vento ameaçavam carregar o consumido corpo de Coroca e no pontilhão ela teve de apoiar-se no braço do acompanhante. Com tanta chuva ninguém punha o pé fora de casa, mas não compete à parturiente escolher a data da desova.

Quando atendeu Hilda e a aliviou, sia Leocádia, entendida em coisas de religião, explicara que a hora e o dia são anotados na folhinha do céu, com antecedência. A parteira zombava das crendice anciã: quer dizer que quando o menino nasce antes de tempo é porque o santo errou nas contas das luas entre o dia da descaração e o do padecimento, me diga vosmicê.

Sia Leocádia ria com os disparates de Coroca, além de pecadora, herege: o ambiente se desanuviava, os trabalhos de parto decorriam fáceis, sob as bênçãos do Senhor.

As estancianas eram de bom parir, ao menos Hilda e Fausta tinham sido, certamente o mesmo iria acontecer com Zeferina. Os maridos, em troca, uns avexados, ao primeiro alarme corriam para a casa da parteira.

Enquanto ordenava os preparativos iniciais, Coroca punha-se a par das iniciativas e dos projetos daquele povo trabalhador, unido e cordato, igual ao de Ambrósio.

E festivo, a se julgar pelo pouco tempo de residência: qualquer pretexto servia para que armassem um arrasta-pé; se possível, de acordo com os demais sergipanos e com a gente do arraial, no último caso eles sozinhos: não deixavam escapar domingo sem um divertimento.

A música não era problema, os quatro homens formavam um conjunto bem ou mal afinado, pouco importava: Vavá e Tarcísio ao violão, Gabriel no cavaquinho, na flauta Jardelino quebrava o galho.

Dois dos mocetões, Zelito e Jair, arranhavam também as cordas da viola e não faziam feio. Sia Leocádia puxava o rancho, a mãe da animação.

Adiante do criatório de Altamirando, onde, no outeiro  pedregoso, as cabras reproduziam-se destras e independentes - cabrito-montês. Ção as apascentava - os estacianos haviam medido várias braças de terra, começavam a roçá-las e plantá-las: campos de mandioca, feijão e milho, de batata-doce a aipim.

 As mulheres se encarregavam da horta, cultivavam as verduras e os legumes mais consumidos na região: chuchu, quiabo, jiló, maxixe, abóbora.

Sia Leocádia explicava:

- Gosto de comer um cozido de sustância... - costumes de Sergipe, influindo na mesa grapiúna, marcando gosto e preferência.


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