quando ouviu um estampido assustador. |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 269
Planejavam plantar um pomar para
cultivar laranjas - a deumbigo, nem o mel se lhe compara no sabor, a d’água e a
seca, a da terra, amarga como fel mas com a casca faz-se o doce mais gostoso - limão
e tangerina, além das frutas que ali cresciam ao deus-dará, tantas e
incomparáveis: jaca, manga, abacate, mamão, caju, mangaba, pitanga, cajá,
jaca-de-pobre, fruta-de-conde, condessa e pinha, groselha, jambo e carambola,
goiaba e araçá, muitas e muitas outras, nem de longe a lista se esgotou.
Touceiras de pés de banana de espécies
variadas: da terra e d’água, da prata e de ouro, a banana-maçã e as de são-tomé,
roxas ou amarelas, boas para levantar as forças dos doentes.
Mais ainda do que em religião, sia
Leocádia era entendida em doces de calda e de pasta, em Estância fazia-os para
vender a numerosa freguesia. No dia em que os estancianos terminassem de
amanhar o chão que haviam demarcado, a feira de Tocaia Grande não ia dar
abasto ao farturão.
Sia Leocádia projetava vender as sobras
na feira de Taquaras.
Habitavam um rancho de palha, enorme,
com divisões para os diversos casais e para a meninada, mas previam para breve
a construção de casas separadas, ao menos quatro.
Parto fácil, ode Zeferina, a exemplo dos
de Hilda e Fausta. Não foi como o de Isaura, trabalhoso, tampouco duplo como o
de Dinorá. Havia uma certa expectativa no arraial em torno da desova de
Zeferina, dando lugar a algumas apostas sobre o sexo da criança.
No decorrer da temporada tinham nascido
quatro machos e quatro fêmeas, caberia a Zeferina o desempate - os peritos
colocavam dinheiro na forma e no empino da barriga.
Nasceu menina já depois das nove da
noite e sia Leocádia anunciou o nome escolhido: Jacinta. Jacinta, ai, não me
diga!
Sim, senhora, o nome da comadre
responsável pelos partos das três estancianas, quem mais merecedora? Não mereço
nada, nem sei o que dizer, isso não se faz.
Tomada de surpresa, Coroca perdeu o
rebolado, viram-na por fim encabulada.
Tudo em ordem, Coroca lavou as mãos com
um pedaço de sabão de coco, outra novidade dos estancianos, tomou o gole de café
coado por Fausta e em cima o trago de aguardente servido por Gabriel. Recusou
acompanhante para o caminho de volta - onde já se viu?
Ao cruzar o pontilhão, assustou-se: as
águas, barulhentas, céleres e rebeldes, encobriam-no, corriam sobre as tábuas, incontroláveis.
Ainda não havia chegado na porta de casa quando ouviu o estampido assustador.
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