(Domingos Amaral)
Episódio Nº 34
Naquela primeira vez
que o vi, Ramiro era um jovem franzino, da mesma idade do que o príncipe.
Filho bastardo de Paio
Soares, encolhia-se na sua presença, pois era tratado com dureza. Ao chegar perto
do cavalo, que o filho não conseguia acalmar, o pai gritou-lhe:
- Sois um tolo, dai cá isso!
Montou em dois tempos
o seu alazão e olhou com desprezo para o bastardo, que logo correu atrás.
Todos tivemos pena
dele, tão mal vestido e humilhado em público. Mas logo o príncipe nos relembrou os
seus desejos, dizendo sempre voluntarioso:
- Vamos para Lanhoso!
Ao princípio da noite,
uma pequena comitiva chegou à povoação já cercada por Dona Urraca e Gelmires, e
foi necessária a intervenção de Fernão Peres de Trava para que fosse autorizada
a nossa entrada no castelo.
Já na presença de Dona
Teresa, que ceava, o Trava revelou a sua profunda desilusão com os
portucalenses.
- Onde estão as nossas
tropas? – perguntou indignado.
Os irmãos de Ribadouro
explicaram que consideravam mais prudente deixá-las em Guimarães, defendendo a
cidade, e que Paio Soares temera vis emboscadas em redor de Lanhoso, preferindo
regressar à Maia com seus homens.
- Deixaram a vossa
rainha à mercê da irmã? – enfureceu-se o Trava.
Também Bermudo
considerou aquela traição indigna, e os irmãos Trava só atenuaram a sua fúria
ao saber que fora o príncipe que forçara a comitiva a vir ajudar a mãe.
- Ao menos, alguém
corajoso! – exclamou Fernão Peres.
Para espanto dos
presentes, Dona Teresa considerou uma tolice o príncipe ter vindo a Lanhoso,
pois não só arriscava a própria vida, como o fazia sem tropas não auxiliando a
mãe em nada.
- Urraca pode, de uma assentada, matar-me a
mim e ao meu filho!
Mirando Afonso
Henriques, em cuja cara se pressentia a desilusão com a reacção maternal,
perguntou-lhe:
- Não vos avisei já
para não lutardes com mulheres?
Agrestes com os
portucalenses, Dona Teresa e seu amante logo nos dispensaram, atribuindo-nos
uns quartos numa habitação secundária da alcáçova, e provavelmente nenhum de
nós teria sabido da surpreendente intriga que veio a urdir-se, não fosse a
minha prima Raimunda ter revelado, mais uma vez, as suas habilidades de espia,
e escutado uma inesperada e improvável conversa que aconteceu nessa noite.
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