(Domingos Amaral)
Episódio Nº 144
Furiosa, Dona Teresa
fixou-o, de olhos semi-cerrados. Pressentindo a controlada mas evidente raiva
dela, Afonso VII comentou:
- E rezai para que no vosso ventre não cresça
um rapaz. Só serviria para criar inúteis transtornos!
Com o rebento ameaçado, Dona
Teresa torceu-se toda. A seu lado, Fernão Peres de Trava estava igualmente
furibundo pois o desafio também lhe era dirigido, como pai da criança.
Contudo, o rei surpreendeu
todos, pois logo após este cortante aviso aproximou-se da tia, revelando
consideração e até preocupação.
- Tendes sido uma boa
regente e espero que o continuareis a ser. Mas não será a criança que trazeis
no ventre a razão das perturbações de Afonso Henriques?
Dona Teresa baixou os olhos
embaraçada, e Afonso VII dobrou-se, beijando-lhe a mão com ternura. Por fim,
disse:
- Seja como for, desejo-vos uma boa gravidez.
Segundo consegui apurar mais
tarde, foi logo na manhã seguinte que, impedido de folgar com a rainha devido
aos enjôos desta o Trava se dedicou a congeminar uma solução para os imbróglios
do Condado.
Horas depois terá chegado à
perversa conclusão de que uma invasão de Afonso VII podia até ser bem vinda
desde que o derrotado fosse Afonso Henriques e não Dona Teresa.
Intuiu que o melhor era não
levar ninguém a Toledo durante o próximo ano, provocando assim o rei, e depois
armar uma cilada obrigando Afonso Henriques a combater o furioso primo,
enquanto Dona Teresa se refugiava em local seguro.
A eliminação física do
ambicioso príncipe poderia sempre acontecer na barafunda de uma batalha
desigual com as tropas do rei e, se ele morresse seria o filho do Trava e de
Dona Teresa que herdaria a Galiza e o Condado Portucalense!
Todas as guerras se iniciam
com pensamentos que as tornam inevitáveis mais tarde. E aquela estava prestes a
começar... Por isso, o Trava e Gelmires adiaram durante algum tempo a busca
pela relíqui a e primeiro tentaram
eliminar Afonso Henriques.
Lamego, Agosto de 1126
Atrás de Raimunda rugia a multidão. Uma mulher gorda trazia na mão uma enorme vassoura e um homem alto transportava uma lança velha, enquanto duas lavadeiras carregavam varapaus.
Qual soldado, de espada e
capacete, Raimunda parou à porta de uma casa, encheu os pulmões e gritou.
- Sai cá para fora, mulher!
Via-se azedume nos olhos de muitos, sobretudo nos das mulheres mais
velhas, que não admitiam aquela desfeita.
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