(Domingos Amaral)
Episódio Nº 130
Gondomar contestou-o, alegando que as Portas do Inferno eram na Terra Santa, no Templo de Salomão, todos o sabiam e mandou-os trabalhar.
Nos dias seguintes, tendo
notado que Ramiro era muito hábil com o arco e com as flechas, Gondomar ordenou
que ele fosse caçar veados, coelhos ou javalis.
A doença dos olhos do mestre
da ordem estava a piorar, com a chegada do calor passava muito tempo a chorar,
e o Velho disse a todos, à volta da fogueira, que precisava de furar o olho.
Desconfiado, o Ameixa
perguntou-lhe:
- O que sabes disso?
O Velho conhecera um
feiticeiro no tempo de El Cid que lhe ensinara a curar a doença dos olhos. Se o
mestre os tivesse vermelhos, devia ser tratado com fel de andorinha, de perdiz,
semente de funcho, era arruda e vinho branco.
Contra as dores havia quem
usasse claras e gemas de ovo, leite de cadela ou de mulher, rosmaninho e pulmão
de carneiro.
Se fossem dores nos dois
olhos, ele devia fechar-se num quarto escuro, e eles podiam usar cinzas de
esterco humano ou urina amassada com mel.
- Cagar e mijar para curar o
nosso mestre! Exclamou o Rato a rir.
O Velho explicou que tal não
seria necessário, pois o Gondomar tinha eram cataratas, que podiam ser
retiradas.
O mestre devia prepara-se
uma semana, com dietas, sangrias e purgas, e tinham de esperar por dia claro,
em que a lua estivesse em quadratura.
Marcou-se a operação para
daí a duas semanas, e foi enquanto esperavam por esse dia que Ramiro descobriu
que se passavam coisas estranhas entre aqueles homens.
Além de montarem os cavalos
dois a dois, o que se podia explicar pela existência de apenas quatro cavalos,
também se amigavam juntos, pelo menos dois deles.
O Urso e o Rato em certas
noites iam passear juntos. Uma vez Ramiro seguiu-os silencioso, e deu com eles
do lado oposto do castelo, dentro de uma pequena torre em cenas uranistas.
O Rato possuía o Urso que
estava de joelhos à sua frente. Ramiro viu o punhal de seu pai, no cinto do
Rato, o cabo incrustado brilhava fugazmente na noite, acompanhando o movimento
do seu portador.
Acho que foi a partir dessa
data que Ramiro ficou perturbado. Alguns começaram a dizer que ele tinha vontade
de fazer o mesmo.
Seja como for, todos notaram
que estava diferente do rapaz que havíamos conhecido em Viseu. Era como se lhe
tivessem tirado um peso de cima.
A convivência com o pai
era-lhe insuportável, esmagava-o, feria-o, intoxicava-o e diminuía-o. Liberto
desse jugo, parecia outro.
Para mais, não ver Chamoa
minorava-lhe a dor. Havia quem dissesse, mais tarde, que Ramiro, depois desse
desgosto, nunca mais foi capaz de amar uma mulher e que, também por isso,
sentia-se bem ali, entre homens.
O seu maior prazer era a
caça, era muito bom nisso, e lembrava sempre que fora a única coisa proveitosa
que seu pai lhe ensinara.
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