(Domingos Amaral)
Episódio Nº 164
- Deu uma pequena risadinha e Zaida
encostou-se mais à mãe e à irmã. Curioso, Mem perguntou:
-
Como haveis apanhado a doença?
O leproso contou que a contraíra na
Vascónia, há muitos anos e tinha vindo para o ocidente à procura de sol, mas
ainda não se conseguira curar. Depois, acrescentou:
- Se qui serdes
podereis passar comigo na barcaça dos leprosos.
Mem, olhou-o surpreendido:
-
Há quem vos leve?
O leproso explicou que, uma vez por semana
e de madrugada, havia um barqueiro que saía mais cedo de Coimbra, para começar
o seu trabalho a partir da margem oposta e aceitava transportá-los.
Estais com sorte, hoje é um dia desses.
Mem perguntou se os soldados não os
revistavam, e o leproso riu-se, como se ele tivesse dito uma chalaça divertida.
Podeis também ir na barcaça com a carroça
– informou.
Algumas horas depois levantaram-se. Antes
de saírem da gafaria, o leproso dirigiu-se a uma parede, onde havia muitas
patas de aves penduradas, e disse às moças que colocassem uma no ombro.
São de ganso, sinal de que sois leprosas –
explicou.
Mem perguntou porque havia tantas ali e
ele disse:
-
São dos mortos. Mas estiveram ao sol, estão limpas.
As mouras fizeram o que ele sugeriu e Mem
subiu para a carroça e fez um sinal para as animar, pois elas continuavam
cheias de medo.
O grupo dos leprosos, ao qual se haviam
juntado mais três enfermas, avançou lentamente a caminho do rio, e Mem seguiu-o
a uma certa distância.
Quando os viu chegar ao local onde as
barcaças partiam, reparou que os soldados se afastavam, temerosos.
Os leprosos entraram para a barcaça sem
problemas e Mem respirou fundo.
Soure, Julho de 1127
A barca dos leprosos atravessou o rio
Mondego enquanto o sol nascia no horizonte. A um canto iam Mem e a sua carroça,
que o almocreve afastou intencionalmente dos doentes, para que os soldados e o
barqueiro de nada desconfiassem.
Umas léguas depois de saíram da estrada,
camuflaram a carroça e prosseguiram a pé.
Mem lembrava-se que talvez a bruxa
conseguisse avisar Abu Zakaria. Embora o resgate só estivesse previsto para
Agosto, o cordovês de certo poderia vir buscá-las à caverna mais cedo.
Ao deixar os jumentos encheu um saco com
comida e dois cantis de água, além de ter pegado no saco das flechas e no seu
arco.
Reparou que as mouras mantinham colocadas
nos ombros as patas de ganso, como sugerira o leproso, ao despedir-se, junto da
barcaça.
- Guardai-as, dão sorte.
Só a meio da tarde descobriram a caverna.
Mem retirou os ramos que cobriam a entrada, mas antes deu pão, fruta e água do
cantil às mulheres.
Acendeu uma vela e foi à frente, tendo
antes tapado o buraco, pois Ramiro podia andar a caçar. Avançaram ao longo de um
túnel e Mem foi reparando que havia outros idênticos, alguns cheios de pedras
devido a desmoronamentos. Aquele era um local perigoso, mas só ali podia
esconder as suas amigas.
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