quarta-feira, janeiro 27, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 164




















- Deu uma pequena risadinha e Zaida encostou-se mais à mãe e à irmã. Curioso, Mem perguntou:

 - Como haveis apanhado a doença?

O leproso contou que a contraíra na Vascónia, há muitos anos e tinha vindo para o ocidente à procura de sol, mas ainda não se conseguira curar. Depois, acrescentou:

- Se quiserdes podereis passar comigo na barcaça dos leprosos.

Mem, olhou-o surpreendido:

 - Há quem vos leve?

O leproso explicou que, uma vez por semana e de madrugada, havia um barqueiro que saía mais cedo de Coimbra, para começar o seu trabalho a partir da margem oposta e aceitava transportá-los.

Estais com sorte, hoje é um dia desses.

Mem perguntou se os soldados não os revistavam, e o leproso riu-se, como se ele tivesse dito uma chalaça divertida.

Podeis também ir na barcaça com a carroça – informou.

Algumas horas depois levantaram-se. Antes de saírem da gafaria, o leproso dirigiu-se a uma parede, onde havia muitas patas de aves penduradas, e disse às moças que colocassem uma no ombro.

São de ganso, sinal de que sois leprosas – explicou.

Mem perguntou porque havia tantas ali e ele disse:

 - São dos mortos. Mas estiveram ao sol, estão limpas.

As mouras fizeram o que ele sugeriu e Mem subiu para a carroça e fez um sinal para as animar, pois elas continuavam cheias de medo.

O grupo dos leprosos, ao qual se haviam juntado mais três enfermas, avançou lentamente a caminho do rio, e Mem seguiu-o a uma certa distância.

Quando os viu chegar ao local onde as barcaças partiam, reparou que os soldados se afastavam, temerosos.

Os leprosos entraram para a barcaça sem problemas e Mem respirou fundo.



Soure, Julho de 1127


A barca dos leprosos atravessou o rio Mondego enquanto o sol nascia no horizonte. A um canto iam Mem e a sua carroça, que o almocreve afastou intencionalmente dos doentes, para que os soldados e o barqueiro de nada desconfiassem.

Umas léguas depois de saíram da estrada, camuflaram a carroça e prosseguiram a pé.

Mem lembrava-se que talvez a bruxa conseguisse avisar Abu Zakaria. Embora o resgate só estivesse previsto para Agosto, o cordovês de certo poderia vir buscá-las à caverna mais cedo.

Ao deixar os jumentos encheu um saco com comida e dois cantis de água, além de ter pegado no saco das flechas e no seu arco.

Reparou que as mouras mantinham colocadas nos ombros as patas de ganso, como sugerira o leproso, ao despedir-se, junto da barcaça.

- Guardai-as, dão sorte.

Só a meio da tarde descobriram a caverna. Mem retirou os ramos que cobriam a entrada, mas antes deu pão, fruta e água do cantil às mulheres.

Acendeu uma vela e foi à frente, tendo antes tapado o buraco, pois Ramiro podia andar a caçar. Avançaram ao longo de um túnel e Mem foi reparando que havia outros idênticos, alguns cheios de pedras devido a desmoronamentos. Aquele era um local perigoso, mas só ali podia esconder as suas amigas.

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