quarta-feira, maio 18, 2016

Assim Nasceu Portugal

A Vitória do Imperador

A Profecia da Normanda























Episódio Nº 10







Lanhoso, Dezembro de 1130


Os preceitos religiosos proibiam as folganças durante o Advento, mesmo entre os que se haviam casado numa igreja, como era o meu caso. Mas é sabido que, apesar de muitos cristãos tentarem cumprir as inúmeras leis de Cristo, essa é uma das que menos conseguem.

Perdida Chamoa, o príncipe de Portugal de Portugal deduziu que um regresso aos braços calorosos e fortes de Elvira era a única forma de se levantar do chão da tristeza onde tombara e mandou às malvas os princípios em que fora educado.

Dias antes do Natal, apareceu em Lanhoso, a cavalo, apenas escoltado por dois fiéis soldados.

Elvira Gualter, a descendente dos vikings que ele havia conhecido em Viseu, ao vê-lo atravessar a porta da alcáçova de um dos mais íngremes e inexpugnáveis castelos portucalenses, abriu um largo sorriso e interrogou-o:

 - Vindes visitar vossas irmãs?

As filhas de Dona Teresa e de Fernão Peres de Trava, chamadas Sancha e Tereza, eram pequeninas e viviam em Lanhoso desde que dona Tereza morrera, na companhia de Elvira, que fora encarregue pela falecida regente de tomar conta delas.

A normanda, loira e alta e com um corpo imponente, não era muito bonita de cara, mas aqueles cabelos dourados e sobretudo as suas formas polpudas, sempre haviam atraído fortemente Afonso Henriques.

Mesmo sabendo que ele apenas a desejava, Elvira aceitava-o com alegria, pois era desprovida de qualquer sentimento de posse.

De baixo nascimento, o pai era pescador de trutas nos rios, a normanda não ambicionava mais do que uma vida tranquila e sabia perfeitamente que o príncipe jamais casaria com ela.

Essa sua aceitação serena da sua condição secundária permitia-lhe, sem qualquer sobressalto de ciúme, dividir os afectos dele com as outras mulheres, nomeadamente Chamoa.

Conhecedora da forte paixão de Afonso Henriques pela galega, Elvira sempre o aconselhara a tratá-la melhor e criticou-o por a ter expulso de Guimarães, mesmo estando ela prenhe de outro.

- Que descaramento! – indignou-se o príncipe – Venho ter convosco a Lenhoso e dizeres que perdoe a Chamoa?

Com a bonomia que existia no seu coração, Elvira limitou-se a sorrir. Aquela humilde dedicada mulher adorava-o e repetiu-o mais uma vez, mas nunca se iludia sobre a insignificância nos destinos conturbados do Condado Portucalense.

- Não tendes ciúmes de outra mulher? – perguntou Afonso Henriques confundido com o desprendimento da moça.

Mais uma vez Elvira sorriu com suavidade e respondeu:

 - A outra sou eu – depois, acrescentou, dando-lhe a mão com ternura: - Vinde ver vossas irmãs, estão muito crescidas.

Entraram enlaçados na torre de menagem de Lenhoso e, quando chegaram à sala, o príncipe viu as duas pequenas irmãs sentadas no chão, a brincarem com bonecas de trapos.

Elvira mandou-as levantar e elas vieram beijar a mão do irmão, educadas mas tímidas, agarrando-se logo às pernas da sua guardiã. Por momentos a má vontade que o príncipe sentia para com Peres de Trava, pai das meninas, bem como a querela nunca sarada com a sua defunta mãe, pareceu impedir Afonso Henriques de mostrar ternura. 

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