A Vitória do Imperador
A Profecia da Normanda
Episódio Nº 10
Lanhoso, Dezembro de 1130
Os preceitos religiosos
proibiam as folganças durante o Advento, mesmo entre os que se haviam casado
numa igreja, como era o meu caso. Mas é sabido que, apesar de muitos cristãos
tentarem cumprir as inúmeras leis de Cristo, essa é uma das que menos
conseguem.
Perdida Chamoa, o príncipe
de Portugal de Portugal deduziu que um regresso aos braços calorosos e fortes
de Elvira era a única forma de se levantar do chão da tristeza onde tombara e
mandou às malvas os princípios em que fora educado.
Dias antes do Natal,
apareceu em Lanhoso, a cavalo, apenas escoltado por dois fiéis soldados.
Elvira Gualter, a
descendente dos vikings que ele havia conhecido em Viseu, ao vê-lo atravessar a
porta da alcáçova de um dos mais íngremes e inexpugnáveis castelos
portucalenses, abriu um largo sorriso e interrogou-o:
- Vindes visitar vossas irmãs?
As filhas de Dona Teresa e
de Fernão Peres de Trava, chamadas Sancha e Tereza, eram pequeninas e viviam em
Lanhoso desde que dona Tereza morrera, na companhia de Elvira, que fora
encarregue pela falecida regente de tomar conta delas.
A normanda, loira e alta e
com um corpo imponente, não era muito bonita de cara, mas aqueles cabelos
dourados e sobretudo as suas formas polpudas, sempre haviam atraído fortemente
Afonso Henriques.
Mesmo sabendo que ele apenas
a desejava, Elvira aceitava-o com alegria, pois era desprovida de qualquer
sentimento de posse.
De baixo nascimento, o pai
era pescador de trutas nos rios, a normanda não ambicionava mais do que uma
vida tranqui la e sabia perfeitamente
que o príncipe jamais casaria com ela.
Essa sua aceitação serena da
sua condição secundária permitia-lhe, sem qualquer sobressalto de ciúme,
dividir os afectos dele com as outras mulheres, nomeadamente Chamoa.
Conhecedora da forte paixão
de Afonso Henriques pela galega, Elvira sempre o aconselhara a tratá-la melhor
e criticou-o por a ter expulso de Guimarães, mesmo estando ela prenhe de outro.
- Que descaramento! –
indignou-se o príncipe – Venho ter convosco a Lenhoso e dizeres que perdoe a
Chamoa?
Com a bonomia que existia no
seu coração, Elvira limitou-se a sorrir. Aquela humilde dedicada mulher
adorava-o e repetiu-o mais uma vez, mas nunca se iludia sobre a insignificância
nos destinos conturbados do Condado Portucalense.
- Não tendes ciúmes de outra
mulher? – perguntou Afonso Henriques confundido com o desprendimento da moça.
Mais uma vez Elvira sorriu
com suavidade e respondeu:
- A outra sou eu – depois, acrescentou,
dando-lhe a mão com ternura: - Vinde ver vossas irmãs, estão muito crescidas.
Entraram enlaçados na torre
de menagem de Lenhoso e, quando chegaram à sala, o príncipe viu as duas
pequenas irmãs sentadas no chão, a brincarem com bonecas de trapos.
Elvira mandou-as levantar e elas vieram beijar a mão do irmão, educadas
mas tímidas, agarrando-se logo às pernas da sua guardiã. Por momentos a má
vontade que o príncipe sentia para com Peres de Trava, pai das meninas, bem
como a querela nunca sarada com a sua defunta mãe, pareceu impedir Afonso
Henriques de mostrar ternura.
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