sexta-feira, setembro 23, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 91






















Ramiro fulminou-o com o olhar, como se lhe desse uma ordem silenciosa, mas imperativa, para evitar aquele caminho e Mem teve a certeza de que aqueles dois eram amantes desavindos.

Talvez Ramiro houvesse optado pela abstinência, cancelado as clandestinidades com o Rato para não comprometer a sua reputação na Ordem do Templo, concluiu Mem, vendo que o barqueiro atracava e levantando-se para se dirigir à embarcação.

Puxou pela trela os seus dois jumentos e a carroça, enquanto os templários traziam o cavalo.

A travessia do rio decorreu em silêncio e foi só quando se meteram a caminho das portas de Coimbra perguntou:

- Onde ides pernoitar? No vosso casão?

Mem confirmou, mas reparou na careta enervada de Ramiro, enquanto ouvia o rato murmurar:

- Se desejardes, posso visitar-vos esta noite. Posso ensinar-vos truques secretos e prazenteiros, as vossas mulheres iriam gostar!

Mem não desejava ser incorrecto com ele, mas também não lhe queria dar esperanças. Preparava-se para o desincentivar quando Ramiro gritou, gritou, voltando-se para trás em cima do cavalo:

 - Rato estúpido, acabai com isso!

Aquela podia apenas ter sido uma desagradável ordem dada por um superior hierárquico, preocupado com a incontinência pecaminosa de um monge guerreiro, mas o almocreve teve a certeza de que não era apenas isso que se tratava.

Homens enciumados, horários alterados...

Ramiro transtornara-se por ver o Rato encher Mem com ofertas de ternuras e isso tinha um significado óbvio. Aqueles dois dificilmente se manteriam castos em Coimbra...


 Coimbra, Outubro de 1133


Notava-se na cidade de Coimbra a agitação que precedia os grandes momentos militares. Centenas de homens circulavam na Almedina e outros tantos encontravam-se acampados fora das muralhas., esperando a ordem de partida.

O exército portucalense reagrupara-se depois do fossado de Peres Cativo e preparava-se para rumar ao Norte, na ânsia de vingar a derrota de Celmes.

Quase todos estávamos lá naquele dia. Afonso Henriques, meu tio Ermígio, eu e meus dois irmãos, Peres Cativo e os prelados Teotónio, Telo e João Peculiar e ainda o bispo Bernardo. A estes, haviam-se juntado o jovem Pêro Pais, filho de Chamoa, bem como o cavaleiro vilão que o trouxera desde Tui, Paio Guterres, que o príncipe de Portugal considerava um valoroso guerreiro.

Só faltava meu pai, Egas Moniz, que em Guimarães supervisionava já a reunião dos restantes exércitos, e o Braganção, senhor de Bragança, que prometera juntar-se a nós perto do local dos combates.


O plano da batalha estava traçado: marcharíamos para Tui, cercando a cidade e os trava, que lá se reuniam no Natal. Além da humilhação de Fernão Peres, obteríamos a libertação do nosso amigo Gonçalo de Sousa, preso nas masmorras do castelo galego.

Site Meter