terça-feira, setembro 27, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)


Episódio Nº 93


















Foi nesse momento que Ramiro entrou na Sé, seguido pelo Rato, mas provavelmente não terá ouvido as últimas palavras do bispo, pois quando o príncipe de Portugal lhe perguntou que novas trazia o templário informou que Abu Zakaria não tinha intenções de atacar Coimbra.

Os mouros iriam ficar quietos em Santarém o que, somado à suspensão do fossado de Peres Cativo, permitia a pacificação da zona, possibilitando aos templários reiniciarem a busca da famosa relíquia.

- É o momento certo -  defendeu Ramiro.

O bispo Bernardo, que assim via a sua lógica política ruir, dirigiu-lhe um olhar furioso, mas a sugestão de Ramiro não convenceu Afonso Henriques.

A Ordem do Templo já antes tentara, sem sucesso procurar o artefacto sagrado. Além disso, lembrou o meu tio Ermígio Moniz, uma ida dos templários até ao Nabão seria sentida pelos mouros como uma provocação torpe.

Se Zakaria não nos ataca, também não o devemos fazer, é uma insensatez! – considerou meu tio Ermígio.

Mais valia promover um encontro pacífico, em que ambos cediam o que a outra parte desejava. Ao ouvi-lo Ramiro indignou-se:

 - Não é admissível comerciar com infiéis!

Desta vez notei que o bispo Bernardo sorriu, pois também pensava assim e já o proclamara. E Afonso Henriques continuava a defender idêntica postura, embora lhe desagradasse concordar com aquele truculento e antipático religioso. Talvez por isso, mostrou-se estranhamente desinteressado da relíquia.

 - Nada disso é prioritário! Quero atacar Tui e libertar Gonçalo!

Levantando-se, pareceu-me um gigante inimitável quando apontou para Pêro Pais e exclamou:

 - Este rapaz de seis anos arriscou a vida para nos vir avisar. Temos de lutar por ele, por Gonçalo e por todos os portucalenses que morreram em Celmes!

Ouviu-se uma aclamação geral. O intenso desejo de retaliação guerreira inflamava os nossos corações, sobrepondo-se a tudo o resto.

A busca da relíquia ficaria suspensa, as princesas continuariam presas em Coimbra e a inauguração da capela do Mosteiro de Santa Cruz avançaria mesmo!

Dito isto, o príncipe de Portugal anunciou mais uma novidade: como Peres cativo iria connosco para o Norte, o comandante das tropas no Sul seria Paio Guterres, em depositava a máxima confiança! O cavaleiro -vilão ajoelhou à sua frente, agradecendo a honra, enquanto o príncipe acrescentava:

 - Além de destemido guerreiro, haveis trazido até nós, são e salvo, o filho primogénito de Chamoa!

O coração do meu melhor amigo amaciara-se um pouco, ao ouvir da boca do petiz os relatos das sucessivas tentativas da mãe de nos avisar dos planos de ataque contra Celmes.

Comovera-o essa manifestação de lealdade da minha cunhada galega, bem como o encontro com Pêro Pais que todos admirávamos e em quem se viam estampadas as nobres qualidades do seu defunto pai, Paio Soares.

Quem ficou atarantado com aquela declaração do príncipe foi Ramiro. O pobre templário, ao ouvir falar em Chamoa, tornou-se lívido. Olhava para Pêro Pais, abria e fechava a boca, engolindo em seco, sem entender.

Vendo-o paralisado, Afonso Henriques perguntou-lhe, espantado por ele nada dizer ou fazer:


 - Não abraçais vosso irmão?

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