(Domingos Amaral)
Episódio Nº 98
Por diversas vezes já me
dera conta de que aquele era um animal demasiado nervoso. Os seus ouvidos
tinham dificuldade em suportar o barulho do acampamento quanto mais a berraria
de uma batalha.
Atordoado e instável, o
cavalo do príncipe rendeu-se às evidências. Não fora feito para participar em
combates e pela primeira vez recusou uma ordem de Afonso Henriques. Vi o meu
melhor amigo furioso, esporeando o animal, um exercício inútil, pois este
exibia uma patética recusa em prosseguir.
Decidido a parar por ali,
baixou-se e sentou-se na lama, enfurecendo o príncipe, que lhe gritava desesperado,
enquanto os soldados o olhavam desconfiados com as suas capacidades de comando.
Este absurdo espectáculo hípico,
alem de alienar a concentração do príncipe, revelou-se também danoso para a
nossa linha da frente.
Tendo visto Afonso Henriques
recuar, muitos cavaleiros –vilões, sobretudo os que estavam longe, julgaram que
era essa a intenção e desataram também a fazê-lo.
O movimento, como seria de
esperar, ainda agravou mais a confusão junto à margem. Desanimado, mas lúcido,
apercebi-me de que nada podia fazer, a não ser reconhecer uma humilhante
derrota e promover uma retirada ordeira.
Acerquei-me de Peres Cativo
e ambos concordámos que o ataque estava condenado ao insucesso, mas o alferes
alertou-me para o perigo de um recuo precipitado e demasiado rápido.
À medida que os nossos diminuíssem
na margem, os que ficavam tornavam-se presa fácil para os soldados do Trava. Podemos
perder mais de seiscentos homens – alertou Peres Cativo.
Passei os olhos pelo combate
e depois perguntei:
- Pensais o mesmo do que eu?
O alferes acenou com a
cabeça: a nossa única hipótese era propor uma trégua, admitindo o fracasso, mas
forçando o trava a suspender os seus ataques enquanto saiamos dali.
Embora fosse uma solução viável,
vendê-la ao príncipe era tarefa hercúlea, pois todos conhecíamos em mostrar-se
vencido.
Prestei-me a ir dizer-lhe o
que decidíramos e, para minha grande surpresa, Afonso Henriques que estava
junto ao cavalo sentado, deu o seu acordo.
Desconsolado, com a espada
do pai na mão, mas sem saber o que fazer com ela, olhou para a sua bela besta
castanha, nascida nos topos das Astúrias e afirmou:
- Que animal doido, perde o tino na confusão.
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