Pergunta-me
Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue
Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos
Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente
Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer
Mia Couto, in 'Raiz de Orvalho'
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue
Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos
Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente
Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer
Mia Couto, in 'Raiz de Orvalho'
Mia Couto nasceu e foi escolarizado na Beira, cidade capital da província de Sofala, em Moçambique - África. Adotou o seu pseudónimo porque tinha uma paixão por gatos e porque o seu irmão não sabia pronunciar o nome dele. Com 14 anos de idade, teve alguns poemas publicados no jornal "Notícias da Beira"e três anos depois, em 1971, mudou-se para a cidade capital de Moçambique, Lourenço Marques (agora Maputo). Iniciou os estudos universitários em medicina, mas abandonou esta área no princípio do terceiro ano, passando a exercer a profissão de jornalista depois do 25 de Abril de 1974.
Além de considerado um dos escritores mais importantes de Moçambique, é o escritor moçambicano mais traduzido. Em muitas das suas obras, Mia Couto tenta recriar a língua portuguesa com uma influência moçambicana, utilizando o léxico de várias regiões do país e produzindo um novo modelo de narrativa africana. Terra Sonâmbula, o seu primeiro romance, publicado em 1992, ganhou o Prémio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos em 1995 e foi considerado um dos dez melhores livros africanos do século XX por um júri criado pela Feira do Livro do Zimbabué.
A 25 de Novembro de 1998 foi feito Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada. Em 2007, foi entrevistado pela revista Isto É. Foi fundador de uma empresa de estudos ambientais da qual é colaborador.
Em 2013 foi homenageado com o Prémio Camões, que lhe foi entregue a 10 de Junho no Palácio de Queluz pelas mãos dos ex-presidentes de Portugal, Cavaco Silva e do Brasil, Dilma Rousseff.
Mia Couto tem uma obra literária extensa e diversificada, incluindo poesia, contos, romance e crónicas.
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