segunda-feira, novembro 28, 2016

A grande experiência

da oração

Richard Dawkins – “A Desilusão de Deus”













Um engraçado, se bem que algo patético, estudo de caso sobre milagres é a grande experiência da oração:

 - Será que rezar pelos pacientes ajuda a cura?

Normalmente rezam-se orações pela intenção de doentes, tanto em privado como em locais de culto formais.

Fancis Galton, que era primo de Darwin, foi o primeiro a analisar cientificamente se as orações pelas pessoas são eficazes.

Galton observou que todos os Domingos, em Igrejas por toda a Grã-Bretanha, congregações inteiras rezavam em público pela saúde da família real. Não deveriam ser os membros desta, portanto, invulgarmente saudáveis em relação a nós, que apenas somos alvos de orações por parte daqueles que nos são mais próximos e queridos?

Galton investigou o assunto e não encontrou qualquer diferença estatística.

Mais recentemente, o físico Russell Stannard um dos três famosos cientistas religiosos da Grã- Bretanha juntou o peso da sua influência a uma iniciativa financiada pela Fundação Templeton, destinada a testar experimentalmente a proposição segundo a qual rezar pelos pacientes lhes melhora a saúde.

Foram observadas todas as regras:

 - Os pacientes foram colocados aleatoriamente num grupo experimental alvo das orações ou num grupo de controlo sem orações.

Nem os pacientes nem os médicos sabiam quais os pacientes alvo das orações. As pessoas que rezavam apenas sabiam, como era óbvio, o primeiro nome e a primeira letra do apelido para poderem dirigir as orações.

Arrostando galhardamente com a troça a equipa de investigadores fez o seu trabalho, gastando 2,4 milhões de dólares da Fundação Templeton… que ia dizendo que “acreditava que as provas da eficácia da oração estavam a aumentar”.

1802 pacientes em seis hospitais, todos eles submetidos a uma cirurgia de bypass coronário, fizeram parte do estudo desconhecendo que estavam a rezar por eles, sendo que as orações foram proferidas pelos fiéis de três igrejas todas elas distantes dos hospitais.

Os resultados, apresentados na edição de Abril de 2006 do American Heart Jornal, foram inequívocos. Não houve diferença entre os doentes alvo das orações e os restantes.

Que surpresa!!!

 A propósito da história
do Urso de Peluche



 “Haverá alguma coisa que nos toque mais a alma do que espreitar uma galáxia distante por um telescópio de 100 polegadas, segurar na mão um fóssil com 100 milhões de anos ou um utensílio de pedra com 500.000 anos, contemplar de pé o imenso abismo de espaço e tempo que é o grande Canyon, ou escutar um cientista que olhou cara a cara a criação do universo e não pestanejou? É isso a profunda e sagrada ciência.”               

(Michael Shermer)


Será que a religião preenche uma lacuna muito necessária?

Diz-se frequentemente existir no cérebro uma lacuna que tem a forma de Deus e que é preciso preencher.

Temos uma necessidade psicológica de Deus – amigo imaginário, pai, big brother, confessor, confidente – e a necessidade tem de ser satisfeita quer Deus exista de facto, quer não.

 Mas não será que Deus vem atravancar um espaço que melhor seria que preenchêssemos com outra coisa? Talvez a ciência? A arte? A amizade humana? O humanismo? O amor por esta vida, vivida no mundo concreto, sem dar crédito a eventuais vidas para além da morte? Um amor pela natureza – aquilo a que o grande entomólogo E.O. Wilson chamou Biofilia?

Já se apontaram à religião quatro grandes funções na vida humana: explicação, exortação, consolo e inspiração.

 - Historicamente, a religião aspirou a explicar a nossa existência e a natureza do universo em que nos inserimos. Nesta função ela foi, entretanto, completamente ultrapassada pela ciência.

 - Por exortação pretendo dizer a orientação moral sobre o modo como nos devemos comportar.

 - Quanto ao consolo e inspiração abordaremos de seguida mas, à laia de preâmbulo, começaremos com o fenómeno do «amigo imaginário» da nossa infância que julgo ter semelhanças com a crença religiosa.

 Será o fenómeno do amigo imaginário uma ilusão de tipo superior, numa categoria diferente do comum “faz-de-conta” da infância?

Suspeito que o fenómeno do boneco de peluche da infância pode ser um bom modelo para compreender a crença teísta dos adultos. Não sei se os psicólogos já estudaram a questão deste ponto de vista mas seria digna de investigação.

Companheiro e confidente, um Peluche para a vida: esse é, seguramente, um papel que Deus desempenha – uma lacuna que perduraria se Deus desaparecesse.

Outra criança, uma menina, tinha um “homenzinho púrpura” que lhe parecia uma presença real e visível e que se materializava no ar com uma cintilação e um suave tinido.

Visitava-a com regularidade, especialmente quando se sentia sozinha, mas com menor frequência à medida que ela foi crescendo.

Um certo dia, mesmo antes de ir para a escola, o “homenzinho púrpura” apareceu-lhe, anunciado pelo habitual tinir das campainhas, para lhe dizer que não voltaria a visitá-la.

Isto entristeceu a menina, mas o homenzinho púrpura disse-lhe que ela estava a crescer e que no futuro não iria precisar mais dele. Agora tinha de deixá-la para poder ir cuidar de outras crianças. Prometeu-lhe, no entanto, que voltaria se ela precisasse dele a sério.

Voltou, de facto, muitos anos mais tarde, num sonho, numa altura em que ela estava a atravessar uma crise pessoal e a tentar decidir o que fazer à vida.

A porta do quarto abriu-se e apareceu uma carrada de livros, empurrada, quarto dentro… pelo “homenzinho de púrpura”.

Ela interpretou isto como sendo um conselho no sentido de ir para a universidade – conselho que ela seguiu e mais tarde considerou bom.

É uma história enternecedora que consegue, melhor do que qualquer outro exemplo, acercar-nos da compreensão do papel consolador e aconselhador que os deuses imaginários têm na vida das pessoas.

Um ser pode existir apenas na imaginação e, ainda assim, parecer completamente real à criança, dando-lhe verdadeiro consolo e bons conselhos.

Mas melhor ainda, é que os amigos – e os deuses imaginários - têm tempo e paciência para dedicar toda a atenção a quem sofre. E são muito mais baratos do que os psiquiatras ou os conselheiros profissionais.

Terão os deuses, nesse seu papel de consoladores e conselheiros evoluído a partir dos bonecos de peluche por meio de uma espécie de “pedomorfose” psicológica.

A “pedomorfose” é a manutenção na idade adulta, de características da infância.

Terão as religiões, originariamente evoluído, ao longo de gerações, através de um adiamento gradual do momento da vida em que as crianças põem de parte os bonecos de peluche, do mesmo modo que fomos abrandando, ao longo da evolução, o achatamento da testa e a protrusão (projecção para a frente) dos maxilares?

Para completar o quadro, consideremos a possibilidade inversa. Em vez de serem os deuses a evoluir a partir de bonecos ancestrais, será possível que esses bonecos terem evoluído de deuses antigos?

Esta ideia parece menos provável.

O psicólogo norte-americano Julien Jaynes observou que muitas pessoas têm a percepção que os seus próprios processos de pensamento são como uma espécie de diálogo entre o “eu” e outro protagonista interno, situado dentro da cabeça.

Hoje em dia compreendemos que ambas as vozes são nossas e senão o compreendermos somos tratados como doentes mentais.

Foi o que aconteceu, durante um breve período, com Evelyn Waugh, escritor inglês de personalidade difícil.

Sem papas na língua, como era seu timbre, comentou com um amigo: «Não te vejo há muito tempo, mas também tenho visto tão pouca gente porque – não sei se sabias – enlouqueci.»

Depois de recuperar, Evelyn escreveu um romance, “As Desventuras do Senhor Pinfold”, em que descreve o seu período alucinatório e as vozes que então ouvia.

O que Jaynes sugere é que antes do ano 1.000 a.c. a generalidade das pessoas desconhecia que a segunda voz – a que o Sr. Pinfold ouvia – vinha de dentro de si.

Julgavam-na a voz de um deus.

Jaynes vai mesmo ao ponto de localizar a “voz” dos deuses no hemisfério do cérebro oposto ao que controla a linguagem.

Terá sido o momento em que as pessoas se deram conta de que as vozes exteriores que lhes parecia ouvir vinham, efectivamente, de dentro de si mesmas.

Jaynes considera esta transição histórica como o alvor da consciência humana.

Os deuses seriam, então, vozes alucinadas que falavam dentro das cabeças das pessoas.

Assim, e numa espécie de inversão da hipótese da pedomorfose, os deuses alucinados começaram, primeiro, por desaparecer das mentes adultas e foram, depois, puxados para trás, para fases cada vez mais recuadas da infância, até às suas actuais sobrevivências sob a forma de fenómenos como o boneco de peluche ou o “homenzinho púrpura”. O problema desta versão é que não explica a persistência dos deuses, hoje, na idade adulta.

Talvez seja melhor não tratar os deuses como antepassados dos bonecos de peluche ou vice-versa, mas antes encarar ambos como sub-produtos da mesma predisposição psicológica que têm em comum o poder de confortar.

Richard Dawkins


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