da oração
Richard Dawkins – “A
Desilusão de Deus”
Um engraçado, se bem que algo patético, estudo de caso sobre
milagres é a grande experiência da oração:
- Será que rezar pelos pacientes ajuda a cura?
Normalmente rezam-se orações pela intenção de doentes, tanto em
privado como em locais de culto formais.
Fancis Galton, que era primo de Darwin, foi o primeiro a
analisar cientificamente se as orações pelas pessoas são eficazes.
Galton observou que todos os Domingos, em Igrejas por toda a
Grã-Bretanha, congregações inteiras rezavam em público pela saúde da família
real. Não deveriam ser os membros desta, portanto, invulgarmente saudáveis em
relação a nós, que apenas somos alvos de orações por parte daqueles que nos são
mais próximos e queridos?
Galton investigou o assunto e não encontrou qualquer diferença
estatística.
Mais recentemente, o físico Russell Stannard um dos três famosos
cientistas religiosos da Grã- Bretanha juntou o peso da sua influência a uma
iniciativa financiada pela Fundação Templeton, destinada a testar
experimentalmente a proposição segundo a qual rezar pelos pacientes lhes
melhora a saúde.
Foram observadas todas as regras:
- Os pacientes
foram colocados aleatoriamente num grupo experimental alvo das orações ou num
grupo de controlo sem orações.
Nem os pacientes nem os médicos sabiam quais os pacientes alvo
das orações. As pessoas que rezavam apenas sabiam, como era óbvio, o primeiro
nome e a primeira letra do apelido para poderem dirigir as orações.
Arrostando galhardamente com a troça a equi pa
de investigadores fez o seu trabalho, gastando 2,4 milhões de dólares da
Fundação Templeton… que ia dizendo que “acreditava que as provas da eficácia da
oração estavam a aumentar”.
1802 pacientes em seis hospitais, todos eles submetidos a uma
cirurgia de bypass coronário, fizeram parte do estudo desconhecendo que estavam
a rezar por eles, sendo que as orações foram proferidas pelos fiéis de três
igrejas todas elas distantes dos hospitais.
Os resultados, apresentados na edição de Abril de 2006 do
American Heart Jornal, foram inequívocos. Não houve diferença entre os doentes
alvo das orações e os restantes.
Que surpresa!!!
A propósito da
história
do Urso de Peluche
“Haverá
alguma coisa que nos toque mais a alma do que espreitar uma galáxia distante
por um telescópio de 100
polegadas, segurar na mão um fóssil com 100 milhões de anos ou um utensílio de
pedra com 500.000 anos, contemplar de pé o imenso abismo de espaço e tempo que
é o grande Canyon, ou escutar um cientista que olhou cara a cara a criação do
universo e não pestanejou? É isso a profunda e sagrada ciência.”
(Michael Shermer)
Será que a religião preenche uma lacuna muito necessária?
Diz-se frequentemente existir no cérebro uma lacuna que tem a
forma de Deus e que é preciso preencher.
Temos uma necessidade psicológica de Deus – amigo imaginário,
pai, big brother, confessor, confidente – e a necessidade tem de ser satisfeita
quer Deus exista de facto, quer não.
Mas não será que Deus vem atravancar um espaço que melhor
seria que preenchêssemos com outra coisa? Talvez a ciência? A arte? A amizade
humana? O humanismo? O amor por esta vida, vivida no mundo concreto, sem dar
crédito a eventuais vidas para além da morte? Um amor pela natureza – aqui lo a que o grande entomólogo E.O. Wilson chamou
Biofilia?
Já se apontaram à religião quatro grandes funções na vida
humana: explicação, exortação, consolo e inspiração.
- Historicamente, a religião aspirou a explicar a nossa
existência e a natureza do universo em que nos inserimos. Nesta função ela foi,
entretanto, completamente ultrapassada pela ciência.
- Por exortação pretendo dizer a orientação moral sobre o
modo como nos devemos comportar.
- Quanto ao consolo e inspiração abordaremos de seguida
mas, à laia de preâmbulo, começaremos com o fenómeno do «amigo imaginário» da
nossa infância que julgo ter semelhanças com a crença religiosa.
Será o fenómeno do amigo imaginário uma ilusão de tipo
superior, numa categoria diferente do comum “faz-de-conta” da infância?
Suspeito que o fenómeno do boneco de peluche da infância pode
ser um bom modelo para compreender a crença teísta dos adultos. Não sei se os
psicólogos já estudaram a questão deste ponto de vista mas seria digna de
investigação.
Companheiro e confidente, um Peluche para a vida: esse é,
seguramente, um papel que Deus desempenha – uma lacuna que perduraria se Deus
desaparecesse.
Outra criança, uma menina, tinha um “homenzinho púrpura” que lhe
parecia uma presença real e visível e que se materializava no ar com uma
cintilação e um suave tinido.
Visitava-a com regularidade, especialmente quando se sentia
sozinha, mas com menor frequência à medida que ela foi crescendo.
Um certo dia, mesmo antes de ir para a escola, o “homenzinho
púrpura” apareceu-lhe, anunciado pelo habitual tinir das campainhas, para lhe
dizer que não voltaria a visitá-la.
Isto entristeceu a menina, mas o homenzinho púrpura disse-lhe
que ela estava a crescer e que no futuro não iria precisar mais dele. Agora
tinha de deixá-la para poder ir cuidar de outras crianças. Prometeu-lhe, no
entanto, que voltaria se ela precisasse dele a sério.
Voltou, de facto, muitos anos mais tarde, num sonho, numa altura
em que ela estava a atravessar uma crise pessoal e a tentar decidir o que fazer
à vida.
A porta do quarto abriu-se e apareceu uma carrada de livros,
empurrada, quarto dentro… pelo “homenzinho de púrpura”.
Ela interpretou isto como sendo um conselho no sentido de ir
para a universidade – conselho que ela seguiu e mais tarde considerou bom.
É uma história enternecedora que consegue, melhor do que
qualquer outro exemplo, acercar-nos da compreensão do papel consolador e
aconselhador que os deuses imaginários têm na vida das pessoas.
Um ser pode existir apenas na imaginação e, ainda assim, parecer
completamente real à criança, dando-lhe verdadeiro consolo e bons conselhos.
Mas melhor ainda, é que os amigos – e os deuses imaginários -
têm tempo e paciência para dedicar toda a atenção a quem sofre. E são muito
mais baratos do que os psiqui atras
ou os conselheiros profissionais.
Terão os deuses, nesse seu papel de consoladores e conselheiros
evoluído a partir dos bonecos de peluche por meio de uma espécie de
“pedomorfose” psicológica.
A “pedomorfose” é a manutenção na idade adulta, de
características da infância.
Terão as religiões, originariamente evoluído, ao longo de
gerações, através de um adiamento gradual do momento da vida em que as crianças
põem de parte os bonecos de peluche, do mesmo modo que fomos abrandando, ao
longo da evolução, o achatamento da testa e a protrusão (projecção para a
frente) dos maxilares?
Para completar o quadro, consideremos a possibilidade inversa.
Em vez de serem os deuses a evoluir a partir de bonecos ancestrais, será
possível que esses bonecos terem evoluído de deuses antigos?
Esta ideia parece menos provável.
O psicólogo norte-americano Julien Jaynes observou que muitas
pessoas têm a percepção que os seus próprios processos de pensamento são como
uma espécie de diálogo entre o “eu” e outro protagonista interno, situado
dentro da cabeça.
Hoje em dia compreendemos que ambas as vozes são nossas e senão
o compreendermos somos tratados como doentes mentais.
Foi o que aconteceu, durante um breve período, com Evelyn Waugh,
escritor inglês de personalidade difícil.
Sem papas na língua, como era seu timbre, comentou com um amigo:
«Não te vejo há muito tempo, mas também tenho visto tão pouca gente porque –
não sei se sabias – enlouqueci.»
Depois de recuperar, Evelyn escreveu um romance, “As Desventuras
do Senhor Pinfold”, em que descreve o seu período alucinatório e as vozes que
então ouvia.
O que Jaynes sugere é que antes do ano 1.000 a.c. a generalidade das pessoas
desconhecia que a segunda voz – a que o Sr. Pinfold ouvia – vinha de dentro de
si.
Julgavam-na a voz de um deus.
Jaynes vai mesmo ao ponto de localizar a “voz” dos deuses no
hemisfério do cérebro oposto ao que controla a linguagem.
Terá sido o momento em que as pessoas se deram conta de que as
vozes exteriores que lhes parecia ouvir vinham, efectivamente, de dentro de si
mesmas.
Jaynes considera esta transição histórica como o alvor da
consciência humana.
Os deuses seriam, então, vozes alucinadas que falavam dentro das
cabeças das pessoas.
Assim, e numa espécie de inversão da hipótese da pedomorfose, os
deuses alucinados começaram, primeiro, por desaparecer das mentes adultas e
foram, depois, puxados para trás, para fases cada vez mais recuadas da
infância, até às suas actuais sobrevivências sob a forma de fenómenos como o
boneco de peluche ou o “homenzinho púrpura”. O problema desta versão é que não
explica a persistência dos deuses, hoje, na idade adulta.
Talvez seja melhor não tratar os deuses como antepassados dos
bonecos de peluche ou vice-versa, mas antes encarar ambos como sub-produtos da
mesma predisposição psicológica que têm em comum o poder de confortar.
Richard Dawkins
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