"Abaixa-te Alferes..." |
Lembranças da Guerra
(Parte 2)
O episódio que ontem vos contei da ida à água, de Unimog, no
primeiro dia de ocupação pelo meu Grupo de Combate da roça de café, Rainha Santa,
abandonada pelos seus donos retirados para Luanda ou Portugal, aguardando o
desenrolar dos acontecimentos, tal como nos desafios de futebol, não acabou com
o apito do árbitro.
Se atentarmos bem em tudo quanto se diz e discute a seguir aos jogos, mais correcto seria afirmar que eles começam depois de terem terminado.
Com os episódios de guerra, a coisa fia mais fino porque há
balas pelo ar mesmo que não acertem mas, especialmente nestes casos, passados
os momentos críticos, já relaxados, regressados ao armazém improvisado que servia de camarata,
sentado em cima da cama, os corações voltam ao seu normal com os sorrisos e as
piadas.
Entre os soldados que tinham ido à agua, cinco no total,
contando com o condutor, 53 anos depois, recordo o “Maia” e o “Alferes”, tão
diferentes um do outro...!
O “Maia”, como a alcunha diz, era da Maia, Norte de Portugal, atlético,
possante, corajoso e disponível.
O “Alferes” era do Sul, arredores de Lisboa, alourado, olhos
claros, branqui nho e sempre que
podia escondia-se do perigo, medroso que era.
Ambos caíram na emboscada e deitado no chão, como mandam as
regras, o Alferes meteu a cabeça no chão com o medo, olhos, acredito que fechados, à espera que o
perigo passasse sem nada lhe acontecer.
O “Maia” também no chão, deitado atrás dele, mas com os olhos
bem abertos, vislumbrou, no meio da confusão, um “terrorista” em pé, junto a
uma árvore, e gritou para o Alferes:
- Baixa a cabeça, “Alferes”,
que eu vou fazer fogo!
Ao que este respondeu, cada vez mais metido pelo chão dentro:
- Eh pá, não me chames Alferes que eles matam-me! ...
Era dos livros da guerra subversiva que os oficiais deviam ser os primeiros a ser mortos e por isso, quando iam para a mata, em operações os galões e divisas ficavam no bolso. Até os óculos se tiravam por serem indicativos que o eu portador tinha estudos...
Era dos livros da guerra subversiva que os oficiais deviam ser os primeiros a ser mortos e por isso, quando iam para a mata, em operações os galões e divisas ficavam no bolso. Até os óculos se tiravam por serem indicativos que o eu portador tinha estudos...
- Como recordo com saudades o Maia, meu amigo Maia, soldado corajoso e disponível, infelizmente já falecido, que tantas vezes me ajudou aliviando-me do peso
do equi pamento nas operações mais
exigentes que duravam dois dias na mata e requeriam uma grande resistência física
em que nunca fui pródigo.
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