quarta-feira, dezembro 28, 2016

Feiras de Gado

















O Ministro português dos Negócios Estrangeiros, Santos Silva, comparou, com sentido de desprimor, as reuniões da Concertação Social entre representantes do Patronato e dos Sindicatos, com o patrocínio do governo, sobre o valor do Salário Mínimo Nacional, com as discussões que aconteciam antigamente nas feiras de gado. Depois... veio pedir desculpa porque lá entendeu que estava a ofender alguém.

Mas isso, agora, não interessa. Falo deste assunto por causa das Feiras de Gado e as saudades que elas me despertaram pois, noutros tempos, muitas destas Feiras estavam associadas a Festas das quais eram eventos paralelos.

Eu era miúdo e não falhava nenhuma, até porque estava de férias-grandes, das Festas de Alvega a cuja freguesia pertencia a aldeia dos meus avós, a Concavada, a 2,5 km de distancia, e ambas atravessadas pela estrada nacional que segue do litoral do país para o interior, pela região das Beiras, e cujo traçado por aquele local ia custando a vida ao meu avô que se meteu no assunto.

E dessa Feira de Gado o que mais recordo era a junta de bois do meu primo Firmino, que estava casado com a filha da irmã da minha avó mas, na realidade, a ligação mais forte que tinha era com a sua junta de bois que nunca faltava na Feira de Gado das Festas de Alvega. Lá estava ele, na sua melhor fatiota, direito, segurando numa mão a aguilhão e na outra a corda que ligava os bois, o seu orgulho, que não os havia mais bonitos, gordos e lustrosos de tanto escovados e bem tratados.

Não o confessava, era evidente. O que as pessoas sentiam não era, nessa época, objecto de grandes conversas, nem parecia bem ser-se expansivo, andar a confessarem-se em público para não passarem por “fala baratos” e perderem credibilidade.

Ele era, de resto, pessoa de poucas palavras, monossílabos, a maior parte deles trocados com os bois. Levantava-sede noite mais do que uma vez para ir ao palheiro renovar-lhes as camas com palha limpa e seca e dar-lhes de comer, cuidados como se fossem filhos.

Atrelava-os à carroça e todos os dias os levava para os terrenos de sua propriedade onde trabalhava regressando à tarde, atravessando a aldeia como se num desfile, seguindo na frente com o aguilhão ao ombro, boné na cabeça, imponente, homem grande e vaidoso que era, para além de inteligente.

O seu único filho, o meu primo Quim Varandas, muito estudioso e bom aluno, fez-se engenheiro do Técnico, mas era um homem apagado comparado com o pai que apenas teria andado na escola para aprender a ler e escrever, como era de esperar no século XIX.

Foi com ele que aprendi, vendo, a fazer cigarros de onça de enrolar, em que era exímio. Os seus gestos eram rigorosos e automáticos, tudo lhe saía bem logo à primeira, sem desperdícios, nem de tabaco nem de papel.

Mas a relação privilegiada era com os seus bois, mais do que com a família, e a feira de gado das Festas de Alvega, que dá o título a este texto, era o local e o momento em que ele mostrava orgulhoso e deleitado a sua junta de bois...





PARECER
(solicitado a Ricardo A. Pereira

em 2015 pelo então 1º ministro Passos Coelho)









Caro Sr. primeiro-ministro,





O conjunto de medidas que me enviou para apreciação parece-me extraordinário.  Confiscar as pensões dos idosos é muito inteligente.

Em 2015, ano das próximas eleições legislativas, muitos velhotes já não estarão cá para votar. Tem-se observado que uma coisa que os idosos fazem muito é falecer. É uma espécie de passatempo, competindo em popularidade com o dominó.

E, que se lhe cortarmos na pensão, essa tendência agrava-se bastante. Ora, gente defunta não penaliza o governo nas urnas. 
Essa tem sido uma vantagem da democracia bastante descurada por vários governos, mas não pelo seu.

Por outro lado, mesmo que cheguem vivos às eleições, há uma probabilidade forte de os velhotes não se lembrarem de quem lhes cortou o dinheiro da reforma.

O grande problema das sociedades modernas são os velhos. Trabalham pouco e gastam demais. Entregam-se a um consumo desenfreado, sobretudo no que toca a drogas que são compradas na farmácia, mas não deixam de ser drogas.

A culpa é da medicina, que lhes prolonga a vida muito para além da data da reforma. Chegam a passar dois ou três anos repimpados a desfrutar das suas pensões. 

A esperança de vida destrói a nossa esperança numa boa vida, uma vez que o dinheiro gasto em pensões poderia estar a ser aplicado onde realmente interessa, como os swaps, as PPP e o BPN. 

Se me permite, gostaria de acrescentar algumas ideias para ajudar a minimizar o efeito negativo dos velhos na sociedade portuguesa:

1. Aumento da idade de reforma para os 85 anos. Os contestatários do costume dirão que se trata de uma barbaridade, e que acrescentar 20 anos à idade da reforma é muito. 

Perguntem aos próprios velhos. Estão sempre a queixar-se de que a vida passa a correr e que 20 anos não são nada.
 É verdade: 20 anos não são nada. Respeitemos a opinião dos idosos, pois é neles que está a sabedoria.

2. Exportação dos velhos. O velho português é típico e pitoresco. Bem promovido, pode ter aceitação lá fora, quer para fazer pequenos trabalhos, quer apenas para enfeitar um alpendre, um jardim.

Ricardo Araújo Pereira 




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