Tratado de Lisboa
Tratado de Lisboa
Tenho por Pacheco Pereira e Miguel Portas a consideração devida a dois homens cultos, inteligentes e que intervêm na política de forma coerente ao serviço de ideias e projectos para a sociedade.
Ouvem-se com gosto porque mobilizam a nossa atenção, o Miguel, de forma arrebatada e Pacheco Pereira num discurso mais pausado e bem elaborado.
Ontem, nos Prós e Contras, ambos apontaram defeitos ao novo Tratado da Constituição Europeia que ficará na história como Tratado de Lisboa enquanto defendiam a necessidade ou vantagem de o submeter a Referendo para ratificação.
A Sérgio Sousa Pinto, deputado ao Parlamento Europeu e ao Secretário de Estado dos N. Estrangeiros, João Cravinho, ficou a defesa das vantagens deste Tratado tendo, este último, deixado para mais tarde, em momento que o governo considere oportuno, a forma da sua ratificação, por referendo, de acordo com anteriores promessas, ou por via parlamentar.
A União Europeia é uma construção política que se iniciou após a 2ª G.G., concretamente, em 1951, com a celebração do Tratado de Paris que criou a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço que congregava a Alemanha Ocidental, França, Itália e os países da Benelux.
Os seus inspiradores foram Robert Shuman, ministro dos Negócios Estrangeiros da França e Jean Monet o seu primeiro Presidente.
O objectivo deste Tratado, tal como está definido no seu nº2, era contribuir, graças ao mercado comum do carvão e do aço, para a expansão económica, aumento do emprego e melhoria dos níveis de vida.
Fora do Tratado estava o trauma de milhões de mortos de mais uma guerra na Europa que tinha, praticamente, acabado de terminar e que era indispensável evitar que voltasse a acontecer no futuro.
Para que o mercado comum pudesse funcionar foi instaurada a livre circulação de produtos sem direitos aduaneiros nem encargos.
O balanço dos resultados desta Comunidade foram positivos tendo-se assegurado o desenvolvimento equilibrado da produção e distribuição dos recursos.
A produção do aço quadruplicou relativamente à década de 50, da mesma forma que a sua qualidade melhorou sendo a produção menos cara e poluente.
Relativamente ao carvão a produção diminuiu bem como a sua mão-de-obra embora o sector tenha atingindo um elevado nível de desenvolvimento tecnológico, de segurança e de qualidade ambiental.
Do ponto de vista social foram criadas reformas antecipadas, subsídios transitórios, ajudas à mobilidade, formação profissional, etc…e todas estas medidas assumiram uma grande importância para se vencerem as crises.
Mas a este Tratado de Paris, de 1951, outros se seguiram que a baixo enumeramos, como reconhecimento de que este era o caminho que a Europa devia seguir no futuro e o recente processo da Globalização, com a abertura de mercados por todo o mundo, tornou definitiva e irreversível a opção.
Tratados Europeus:
-1951--------------Tratado de Paris
-1957--------------Tratado de Roma
-1965--------------Tratado de Fusão
-1992--------------Tratado de Maastricht
-1996--------------Tratado de Amsterdão
-2000-------------Tratado de Nice
-2004-------------Tratado de Roma II
-2007-------------Tratado de Lisboa
O que se tem vindo a discutir na União Europeia desde 1951 são aspectos deste ou daquele Tratado, passos que uns querem mais curtos e outros mais largos, mas não a União em si.
Isso mesmo ouvimos nós tanto a Miguel Portas como a Pacheco Pereira, é o “andar muito depressa”, são os “problemas atirados para debaixo do tapete” e, fundamentalmente, o risco e a incerteza do futuro.
Por isso, quando Sérgio Sousa Pinto argumentava com as conquistas que certos dispositivos do Tratado representavam para o reforço da justiça, da segurança e da democracia na Europa, Pacheco Pereira contrapunha que não era crente e neste ponto se situou o âmago das diferenças:
- De um lado, os cépticos, pessimistas e não crentes e do outro, os que acreditam e têm fé nas virtualidades do Tratado.
A União Europeia é a maior experiência de natureza política alguma vez levada a cabo em todo o mundo.
Comunidades de pessoas constituídas em Nações e organizadas em Estados, todas elas vizinhas entre si, com histórias de vidas de séculos ao longo dos quais conviveram e lutaram umas com as outras ao sabor de interesses e ambições, num belo dia tiveram um sonho:
-E porque não, voluntariamente, porem em comum exactamente aquilo que era o verdadeiro motivo das suas lutas e desinteligências?
-E porque não, voluntariamente, abdicarem de uma parte da sua soberania pela qual, ao longo dos tempos, tantos compatriotas morreram e foram consagrados heróis, a favor de um todo chamado Europa?
-E porque não transformar uma realidade geográfica, física e geoestratégica, numa realidade política e económica?
-E porque não pôr a trabalhar e a conviver num espaço alargado cidadãos que apenas se visitavam entre si quando não se estavam a matar uns aos outros?
Poder-se-ia querer algo de mais revolucionário que isto?
Ou revolucionar não é alterar profundamente um determinado statuo quo?
Responder afirmativamente a estas perguntas e partir para a construção desse sonho foi e continua a ser, sem dúvida, uma aventura que requer a assunção de um risco e alguma crença nos resultados que, Pacheco Pereira, afirma não possuir relativamente a este Tratado e como ninguém tem o condão de adivinhar o futuro vamos ter que esperar para saber se ele tem razão.
Parece-me, no entanto, que não é justo criar expectativas para além das que, realisticamente, se devem esperar.
Antes da União tínhamos na Europa estados pequenos, médios e grandes e agora continuamos a tê-los mas dentro da União, a realidade não desapareceu, as desigualdades em tudo o que diferencia um pequeno país como Portugal de um grande país como a Alemanha mantêm-se e a questão que se coloca é a de saber se é preferível conviver com essas diferenças dentro ou fora da União.
Mas aqui Del-Rei que o eixo França-Alemanha manda na União e a Inglaterra só faz o que lhe apetece e eu pergunto, se fora da União, tudo seria diferente a favor dos pequenos e médios países.
E pergunto, igualmente, se certos problemas como os do ambiente e da grande criminalidade não serão melhor combatidos com os mecanismos legais da União Europeia.
E se olharmos agora aos desafios da globalidade e da competição que se estabelece ao nível dos grandes mercados emergentes, ainda percebemos melhor as vantagens da existência deste espaço alargado na Europa mesmo quando as vozes de uns não têm a mesma força do que as vozes de outros.
Mas as intervenções críticas mais do que as pessimistas, são fundamentais para ajudar a definir as orientações futuras da União especialmente as que são produzidas nos seus Órgãos próprios.
Não obstante haver uma determinada correlação de forças é evidente que a União Europeia está, desde o seu início, a ser construída por europeus e de uma forma que parece respeitar valores e princípios democráticos e onde também podemos assinalar medidas de solidariedade para com os países mais carecidos e menos desenvolvidos.
Claro que essa correlação de forças faz-se sentir a favor dos países maiores e mais fortes mas era realista esperar que assim não fosse?
Hoje, nos Jerónimos, será assinado mais um Tratado da União, o oitavo, que receberá o nome de Tratado de Lisboa e passará de seguida, em cada país, à fase de ratificação.
A complexidade do documento ficou bem à vista quando Miguel Portas nos leu uma pequena passagem completamente fora do entendimento da maioria esmagadora dos mortais, portugueses ou de qualquer outra nacionalidade.
Pessoalmente, entendo que em cada país deveria haver a preocupação de explicar a todos os cidadãos, de uma forma simples e concisa, os aspectos mais relevantes deste novo Tratado no que tem a ver mais directamente com as suas vidas.
Quanto à sua ratificação não vejo razão nenhuma para que ela não seja feita pelos deputados que elegemos para nos representarem na Assembleia Legislativa.
Os adeptos do Referendo devem estar mais preocupados com outras coisas do que propriamente com o Tratado em si.
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