segunda-feira, fevereiro 08, 2010


DONA
FLOR
E SEUS DOIS
MARIDOS

EPISÓDIO Nº 39



À noite, diante da residência em festa, os dois embusteiros apostaram com outros valdevinos: penetrariam no baile e nele seriam recebidos com todas as honras, tratados a velas de libra, pois Vadinho fez-se reconhecer pelo Major e por dona Aurora como sobrinho do impedido Delegado Auxiliar enquanto empossava Mirandão no inexistente cargo de Secretário Particular de Chimbo.

- Doutor Aírton Guimarães, meu tio teve de acompanhar o Governador ao Congresso de Obstetrícia. Mas como fazia questão de não faltar ao seu convite, mandou-me a mim e ao seu Secretário, Doutor Miranda para representá-lo. Eu sou o doutor Waldomiro Guimarães…

O Major confessou-se comovido com a gentileza do Delegado a oferecer-lhe desculpas e a fazer-se representar. Lastimava não tê-lo na festa, seu desejo seria homenageá-lo, mas recebiam, ele e sua esposa, de braços abertos o representante de seu estimado amigo. Estendia a mão para Vadinho quando Mirandão, em êxtase e desbragado, corrigiu e pôs todas as coisas nos seus lugares:

- Perdoe-me, Major, a intromissão: representante do doutor Delegado é a minha modesta pessoa, eu doutor José Rodrigues de Miranda, livre-docente da Escola de Agronomia, requisitado pelo doutor Aírton…

O meu amigo doutor Waldomiro, se bem sobrinho do Delegado não o representa, não o representa e, sim, ao Senhor Governador…

- Ao Governador? – exclamou o Major embargado com tanta honra.

- Sim, encarrilhou Vadinho – quando o Governador ouvira o Delegado Auxiliar pedir ao seu Secretário e a seu sobrinho que fossem à festa do Major, lhe ordenara (pois servia no Gabinete de Sua Excelência) “abraçar seu bom amigo Pergentino e cumprimentar sua digna esposa”.

O Major e dona Aurora empanzinados de vaidade, abriam passagem, faziam apresentações, mandavam encher os copos, preparar os pratos, tudo era pouco para Vadinho e Mirandão.

Lá fora, embasbacados, os colegas de maroteira não podiam crer nos próprios olhos. Que patifaria teriam inventado os dois cínicos para serem assim recebidos? Não havia memória de penetra algum ter conseguido ultrapassar os batentes da porta do Major, para quem era uma questão de honra manter a festa nos limites estreitos dos seus convidados, seus amigos que lhe garantiam a decência e o renome. Jurando por seus gloriosos galões, gabava-se: “Penetra em minha festa, só passando sobre o meu cadáver!” E os penetras mais exímios da cidade capazes de penetrar – e tendo penetrado – em festas de todo fechadas e imponentes, guardadas pela polícia, até em festas no Palácio do Governo e na casa do doutor Clemente Mariani, festas ao lado das quais a do Major era simples assustado, dancinha de pobre, forrobodó de bairro, arrasta-pé, esses penetras famosos, todos eles, fracassaram em suas tentativas, cada ano renovadas, de penetrar na festa do Major. Nenhum alcançara transpor os defendidos umbrais

Nenhum, é exagero. Édio Gantois, estudante astucioso, em comparsaria com outro não menos moleque, o fá anteriormente referido Lev Língua de Prata, na ocasião ainda académico, conseguiram os dois, certa feita, penetrar e por meia hora, mais ou menos, manterem-se para serem logo depois expulsos a safanões e sopapos, o musculoso Édio em luta corporal com os convidados, o galalau do Lev trocando pontapés com o Major.

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