sexta-feira, setembro 10, 2010


DONA FLOR
E SEUS
DOIS
AMORES

Episódio Nº 221




- Não vai tardar o dia do caruru de Cosme e Damião, aquela obrigação…

- Tenho pensado nisso, ainda outro dia disse para a patroa: “Será que vai haver esta ano o caruru em casa da comadre?”

- Qual é seu parecer compadre? Que é que acha?

- Pois eu lhe digo, comadre, que ninguém pode andar dois caminhos de uma vez, um de ida, outro de volta. A obrigação não era sua, era do compadre, se enterrou com ele, os ibejes se dão por satisfeitos – fez uma pausa. Se era esse também seu parecer, comadre, então fique descansada, não está agindo mal com os santos nem cortando um preceito pelo meio…

Ouviu dona Flor pensativa, absorta como se pesasse medidas de viver:

- Tem razão, compadre, mas não é só aos santos que a gente tem contas a prestar. Eu tenho vontade de manter a obrigação, seu compadre levava o preceito muito a sério, tem coisas que a gente não pode desmanchar.

- E então, comadre?

- Pois pensei que podia fazer o caruru em casa do compadre. Eu vou lá, no dia ver o menino, levo o necessário, cozinho o caruru e nós comemos. Convido Norminha e mais ninguém.

- Pois seja assim, comadre, como quer. A casa é sua, é só dar ordens. Se eu tivesse a certeza de ter dinheiro, lhe dizia para não levar tempero algum. Mas quem advinha a noite de ganhar e a noite de perder? Se eu soubesse estava rico. Leve seus quiabos, é mais seguro.

Tendo serenado, voltava doutor Teodoro. Já conhecia Mirandão de nome, sabedor de sua fama e de seus feitos, trocaram breves cortesias.

- É meu compadre, Teodoro, um bom amigo.

- Precisa aparecer… - disse o doutor, mas não era um convite, apenas uma frase gentil. Se ele viesse, paciência.

Retornou Mirandão à sua vida airada, Marilda acertava com a mãe a visita de seu Mário Augusto para outro dia, para juntos discutirem as condições do contrato e a data da estreia.

- Vamos, minha querida… - disse o farmacêutico.

Já era tarde, mas ainda assim, para de todo repousar daquelas emoções e desapontos, foi o doutor Teodoro em busca do fagote e da partitura. Dona Flor tomou assento numa cadeira e pôs-se a cerzir punhos e colarinhos das camisas do doutor, todos os dias ele mudava a roupa branca.

Na sala quieta e morna, doutor Teodoro ensaia o solo da romanza composta em homenagem a dona Flor. Curvada sobre a costura, ela ouve um tanto distraída, querendo pôr em ordem
confusos pensamentos. Distante, a cabeça longe dali, em outras músicas.

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