terça-feira, setembro 07, 2010

DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS

Episódio Nº 218


Atenta à discussão sobre a orquestra, descurara dona Flor dos problemas de Marilda, também eles de música e de canto, de proibidas melodias. A última notícia sobre o conflito entre mãe e filha, dona Flor a obtivera da própria moça e se referia ao facto significativo de ter Marilda conhecido, por intermédio de Oswaldinho, aquele Mário Augusto da Estação Menina, a Amaralina, e o dito cujo lhe prometera ouvi-la e, se lhe agradasse a voz, contratá-la para um programa semanal. Oswaldinho nada conseguira na Rádio Sociedade, infelizmente.

Os sucessos posteriores escaparam a dona Flor. Muito ocupada naqueles dias, não pudera conceder a Marilda a atenção devida. Assim sendo, só depois do drama veio a saber do êxito da adolescente no teste ao microfone. Ficou o Mário Augusto abobalhado com a voz e mais ainda com a beleza da jovem, e dispôs-se a contratá-la para um programa de categoria, num bom horário, sábado à noite. Cachê ainda pequeno, porém que mais podia desejar uma estreante? Na bolsa a minuta do contrato, Marilda veio correndo para casa, embargada de emoção.

Dona Maria do Carmo rasgou o papelucho: “lhe criei e eduquei para mulher direita, para se casar. Enquanto eu for viva…

- Mas, mamãe, você tinha prometido… - Marilda lembrava promessa feita pela viúva no dia em que a viu cantar num programa de calouros – você disse que quando eu fizesse dezoito anos…

- Ainda não fez…

- Faltam só três meses…

- Não deixo nunca enquanto estiver sob meu teto. Nunca.

- Sob seu teto? Pois vai ver.

- Ver o quê? Vamos, diga.

- Nada.

Ainda procurou dona Flor, cálido peito amigo, de bom conselho e de conforto. Mas a vizinha saíra após a aula vespertina e Marilda tinha pressa, pois caía a tarde e era demais a tirania, insuportável. Fugiu de casa.

Juntara uns trapos, pares de sapatos, a colecção do Jornal de Modinhas, os retratos de Francisco Alves e Sílvio Caldas, metera tudo na mala, tomou o bonde, aproveitando estar a mãe no banho.

Foi direita à Rádio Amaralina. Ao sabê-la fugida da família, em lágrimas e menor de idade, alarmou-se Mário Augusto, muito responsável e nem sequer a quis ali no edifício: fosse embora quanto antes, não desejava encrencas. Saiu Marilda rua fora e andou ao léu em busca de Oswaldinho. Foi de endereço em endereço, da Rádio Sociedade para o escritório de uma firma comercial, onde o radialista fazia ponto. Dali seguiu para a Cidade Baixa onde ele tinha encontro com os patrocinadores, os poderosos Magalhães. Oswaldinho? O da Rádio? Já fora embora, talvez para os estúdios, ela sabia o endereço? Lá se foi novamente para a Rádio Sociedade, na Rua Carlos Gomes: subiu o elevador Lacerda, andou a Rua Chile, e, cortando a Praça Castro Alves, por fim, suada e tonta, deteve-se na porta da emissora. Oswaldinho não estava, mas o
porteiro lhe permitiu esperar e até lhe arranjou uma cadeira.

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