quinta-feira, abril 28, 2011

TEREZA


BATISTA


CANSADA


DE


GUERRA

Episódio Nº 93






- Sou um romântico incurável, que posso fazer? – exclamava Daniel, o popular Dan das velhotas, no pátio da Faculdade. Estudante de Direito, doutor em malandragem com curso completo nos cabarés, castelos, pensões de mulheres; alto e esguio, lânguido, formoso rapaz; olhos de quebranto, grandes e dolentes (os antigos olhos de dona Beatriz antes da moda oriental), olhar de frete no dizer dos colegas, lábios carnudos, cabelos encaracolados, beleza um tanto equívoca, não por efeminada mas por doentia.

Fez-se Dan o ai-jesus das raparigas nos castelos e das elegantes senhoras na alta-roda, a maioria no fim da pista, nas últimas plásticas. De umas e de outras aceitava dinheiro e presentes e orgulhoso os exibia – gravatas, cintos, relógios, cortes de fazenda, notas de conto de réis – ilustrando com eles picantes relatos a amenizar a chatura das aulas.

Para não magoar seus sentimentos, Zazá do Bico Doce lhe punha às escondidas, no bolso do paletó, parte substancial da féria diária; Dan ia buscá-la pela madrugada no castelo de Isaura Maneta e em idílio desciam a Rua São Francisco para o quartinho arrumado, folhas de pitanga no chão de cimento, cama de lençóis limpos com perfumes de alfazema: no percurso, Zazá, discreta e delicada, obtinha hora e maneira de lhe enfiar o dinheiro no bolso sem ele se dar conta, ingénua Zazá do Bico Doce.

- É só me fazer de distraído e a grana escorre no bolso – esclarece Daniel – sem ferir meus sentimentos.

Já dona Assunta Menendez do Arrabal, de marido idoso e panificador, quarentona na força do apetite, expunha na cama presentes e dinheiro, valorizando as dádivas, revelando os preços, custou caríssimo, meu lindo, um dinheirão (obtinha descontos em lojas de amigos) elogiando procedência e qualidade, casimira inglesa, meu lindo, de contrabando; devassa pendurava gravatas na estrovenga de Dan, cobria-lhe o ventre com cédulas: veja como essa sua coroa é mão aberta, meu lindo!

Com aquele físico perfeito de gigolô, o ar ambíguo de querubim libertino, sentimental e vicioso, possuindo todos os conhecimentos necessários ao nobre ofício, competente e tesudo, bom de dança, bom de bico – lábia fácil, voz sonolenta, mole e cálida, embriagadora – bom de cama – sou o melhor chuparino da Bahia, aliás do Nordeste, quiçá do Brasil – com tantas qualidades reunidas, não conseguia ser um verdadeiro profissional, conforme confidenciava aos colegas:

- Sou um romântico incurável, que posso fazer? Apaixono-me como uma vaca idiota, me dou de graça, e ainda gasto do meu; onde já se viu gigolô decente, gigolô que se preze, desperdiçando dinheiro com mulher? Não passo de um amador.

Riam os colegas de tanto descaro, Dan não tinha jeito, um caso perdido, cinismo demais, embora os íntimos confirmassem a existência de súbitas paixões, levando-o a abandonar protectoras ricas e confortáveis xodós. Sua sorte em amores tornara-se proverbial nos meios estudantis e boémios, atribuíam-lhe renques de amantes, multiplicando-lhe os casos. Desde mocinho, atrevido frangote, ganhava e gastava dinheiro com mulheres.

Raramente os filhos do meritíssimo iam vê-lo na comarca distante. Dona Beatriz, atenta às conveniências, às boas maneiras, numa catequese de razões e promessas, obtinha vez ou outra a companhia de um deles na visita ao esposo e pai. chatas, sem dúvida mas imprescindíveis para o bom conceito de família.

Daniel, o mais rebelde e o menos disponível, há cinco anos não embarcava na lenta composição do da Leste Brasileira – porque hei de ir enterrar um mês naquele buraco, Mater, se posso ver o paterno quando ele der as caras por aqui, sem falar que para essas férias já tenho programa – em compensação visitara Rio, São Paulo, Montevideu, Buenos Aires, em companhia e às custas de generosas devotas de seu físico e de seus talentos. (clik na imagem e aumente)

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